O milagre de viver como brasileiro
José Igídio dos Santos*
Quando se fala em milagre pensamos em algo incrível e de difícil concretização a não ser com uma intervenção divina. E quando se aplica está perspectiva para os “milagres econômicos” uma expectativa é que este beneficie os pobres, mas o que se verifica é que a melhor fatia do bolo sempre fica com os abastados enriquecidos à custa dos pobres, facilmente silenciados por “esmolas” de planos econômicos de subsistência e não de dignidade.
Na história, o chamado milagre econômico brasileiro se baseava em uma ideologia que inculcava em nossas cabeças: é necessário fazer o bolo crescer para, depois, dividi-lo entre todos. Realmente o fermento da euforia ajudou o bolo a crescer, no entanto, a tão esperada divisão não aconteceu, pois o bolo crescido deveria “alimentar melhor as elites e oligarquias” acentuando o empobrecimento das massas; o povo empobrecido ficou "a ver navios".
No Brasil assistimos uma escandalosa concentração de renda em escala mundial em detrimento das condições de vida com dignidade para a maioria da população empobrecida que vive a mercê das “esmolas governamentais” com a fachada da distribuição de renda.
Vemos que aumentou a multidão dos despossuídos, estes não são vítimas do deserdamento e sim do sistema econômico que privilegia o ter ao ser. Observamos o Brasil ainda em 70º. lugar no IDH, a fome ainda é real para uma grande parte da população que têm benesses de programas governamentais e mesmo assim com uma série de irregularidades.
A situação a que chegamos é grave, vimos o aumento “dos sem” (emprego, saúde, casa, terra, dignidade). Nas grandes cidades a situação de opressão, fome e miséria tomam conta das ruas. Estes, a mercê desta situação partem para a criminalidade operacionando o dito popular "mente vazia, oficina do diabo". Outros, partem para a mendicância como via alternativa às suas necessidades. Muitas vezes estes “pobres coitados” são chamados de vagabundos. O fato é que o Brasil é um país de acentuada desigualdade social. Vimos de um lado a opulência desmedida da burguesia que começam a temer os pobres que sobrevivem apesar da pobreza. Nos noticiários cotidianos vemos o crescente índice de crimes que espanta e apavora a todos. Há um clima de desconfiança e temor geral. A população vive assustada, deprimida, depressiva, o dia-a-dia passa a ser de tortura devido ao risco de assaltos e a proliferação dos seqüestros relâmpagos.
A desconfiança assola o empreendedorismo onde o descrédito acentuou as relações econômicas de insegurança que não está mais ancorada em contratos, estes já não são cumpridos.
O momento da crise econômica mundial revela que a salvação não está na economia e comércio livres e tampouco no poder do Estado como superestrutura, mas no equilíbrio e relações harmônicas entre as duas instâncias sem, contudo, desvalorizar a vida humana e a natureza, nossa casa comum espaço sagrado e inviolável. A economia não pode ser a única reguladora da vida em sociedade, o empreendimento mercadológico e os fluxos de capitais acentuaram a crise econômica mundial demonstrando que é tempo de cultivar valores e bens que dinheiro não compre.
É tarefa de toda a sociedade dar condições de melhorar a qualidade da vida aos cidadãos e cidadãs e para tanto, é necessário a emergência de uma nova ordem econômica mundial. Superar as prédicas e colocar em prática a ética dos valores que foram perdidos, tais como a preocupação com o outro em torno da solidariedade e da partilha. A justiça precisa funcionar, pois o que caracteriza o verdadeiro milagre brasileiro é a paciência inesgotável de seu povo, que apático perdeu a insolência de indignar-se.
*Licenciado em Filosofia, Bacharel em Teologia, Psicopedagogo. Docente na Rede Estadual de São Paulo e na Faculdade de Educação, Ciências e Artes Dom Bosco (FAECA), Monte Aprazível-SP.