Emaús: da decepção à redescoberta do novo.
José Igídio dos Santos[1]
Introdução
“Pela estrada de Emaús, caminhando lado a lado Sem conhecer-te Jesus. Peregrino disfarçado. Peregrino impertinente disfarçado em todo irmão. Que caminha com a gente, forçando a luz do poente, querendo partir o pão, querendo partir o pão, querendo partir o pão”.[2]
Contexto do Texto
O texto de Emaús, Lc 24,13-35, é uma reeleitura da história da Páscoa. Ao que sabemos, Lucas escreve seu Evangelho após ano 70 d.C.. Isto significa que o escreve após a destruição de Jerusalém pelos romanos. As comunidades cristãs estão em crise. Suas esperanças diziam que Jesus voltaria. E para onde voltar o Messias, senão para Jerusalém? Mas se Jerusalém não mais existe? O que vai ser agora? Se ao tempo da crucificação os olhos dos discípulos não se abriram, agora os olhos da comunidade estão fechados. Para ajudar a abri-los, Lucas reescreve, ou relê a história de Emaús.
Nosso Contexto
A atual situação do Brasil é questionadora e paradoxal. Por um lado, a fé simples de nossos povos sofre o impacto da modernidade que transmitem valores anti-evangélicos e a conseqüente fragmentação dos valores religiosos e morais. Não bastasse isso, vivemos uma situação de crise em todos os âmbitos: econômico, político, institucional e cultural. Crises que são incodificáveis. Emerge a necessidade de uma cultura de vida em meio à crescente cultura da morte, face às crises existentes. Diante desta situação, somos chamados a assumir com espírito diastólico o dinamismo missionário de sair e ir ao encontro das pessoas, lá onde elas estão. Anunciando com ardor coragem a missão de Cristo a nós confiada. Nas pegadas de Emaús encontraremos a estrada de volta a vida e a esperança. Acompanhemos este percurso através do texto.
O texto
Ao refletir o caminho de Emaús, com a perspectiva da Decepção à redescoberta do novo, queremos traduzir a esperança que brota da vida de Cristo comunicada a nós.
[1]
13 E eis que, nesse mesmo dia, dois dentre eles se dirigiam para uma aldeia chamada Emaús , a duas horas de viagem de Jerusalém.
Aqui pergunto sobre o que significa Emaús e Jerusalém. Estes lugares não têm apenas um referencial geográfico. Jerusalém significa: o medo, o fracasso da cruz, tristeza e falta de esperança. E faço também referência a Emaús como um lugar de fuga, do isolamento, da tranqüilidade intranqüila. Quando era dia os dois fugiam. Jerusalém dava medo e precisavam de refugio num lugar tranqüilo. Vão para Emaús.
14 Eles falavam entre si de todos esses acontecimentos.
A cruz ainda está em Jerusalém. Todos sabiam do que tinha acontecido. Os poderosos que a cravaram em Golgóta estão vivos e presentes. Os principais sacerdotes e as autoridades ainda são as mesmas. O projeto de opressão e morte ainda permanece igual. Tudo isso causou medo ao casal de Emaús. Estes dois parecem ser um casal , um homem e uma mulher, pertencente ao grupo de Jesus. O homem Cléofas. A outra pessoa não tem nome, não fala e não parece em pé de igualdade com Cléofas, ao menos naquela sociedade machista e excludente do feminino. Tudo nos leva a crer que é Maria da qual fala Jo 19,25 que, junto à cruz estava junto com a mãe de Jesus. Um homem e uma mulher, Cléofas e Maria estão a caminho de EMAÚS.
15 Ora, enquanto falavam e discutiam um com o outro, o próprio Jesus os alcançou e caminhava com eles; 16 mas os seus olhos estavam impedidos de o reconhecer .
É Jesus, o não reconhecido que se torna “partner” na caminhada daquele casal, escuta-os por algum tempo. E daqui aprendemos a necessidade de caminhar com as pessoas, e no ritmo em que elas possam acompanhar os nossos passos. É depois da escuta que ele pergunta
Aqui pergunto sobre o que significa Emaús e Jerusalém. Estes lugares não têm apenas um referencial geográfico. Jerusalém significa: o medo, o fracasso da cruz, tristeza e falta de esperança. E faço também referência a Emaús como um lugar de fuga, do isolamento, da tranqüilidade intranqüila. Quando era dia os dois fugiam. Jerusalém dava medo e precisavam de refugio num lugar tranqüilo. Vão para Emaús.
14 Eles falavam entre si de todos esses acontecimentos.
A cruz ainda está em Jerusalém. Todos sabiam do que tinha acontecido. Os poderosos que a cravaram em Golgóta estão vivos e presentes. Os principais sacerdotes e as autoridades ainda são as mesmas. O projeto de opressão e morte ainda permanece igual. Tudo isso causou medo ao casal de Emaús. Estes dois parecem ser um casal , um homem e uma mulher, pertencente ao grupo de Jesus. O homem Cléofas. A outra pessoa não tem nome, não fala e não parece em pé de igualdade com Cléofas, ao menos naquela sociedade machista e excludente do feminino. Tudo nos leva a crer que é Maria da qual fala Jo 19,25 que, junto à cruz estava junto com a mãe de Jesus. Um homem e uma mulher, Cléofas e Maria estão a caminho de EMAÚS.
15 Ora, enquanto falavam e discutiam um com o outro, o próprio Jesus os alcançou e caminhava com eles; 16 mas os seus olhos estavam impedidos de o reconhecer .
É Jesus, o não reconhecido que se torna “partner” na caminhada daquele casal, escuta-os por algum tempo. E daqui aprendemos a necessidade de caminhar com as pessoas, e no ritmo em que elas possam acompanhar os nossos passos. É depois da escuta que ele pergunta
17 “Quais são essas palavras que estais trocando ao caminhar? Então eles pararam, com ar sombrio”. E Jesus obteve a resposta com certa admiração, 18 Um deles, chamado Cléofas, lhe respondeu – parecendo dizer você não está alienado: “Tu és decerto o único homem de passagem por Jerusalém que não tenha sabido o que se passou nestes dias!”.
Jesus age com a “santa ignorância”, assume uma postura pedagógica diferente da convencional – excludente e competitiva. E é justamente aí que aparece a sabedoria de Jesus. Jesus sabia? Sim! Mas, a partir de si e não a partir da experiência daquelas pessoas. E sabemos disso, dependendo do lugar e situação vivencial vemos determinadas coisas e ou acontecimentos de maneira diferente. Num processo dialógico é necessário o saber daqueles com os quais estamos dialogando. 19 Que foi?, disse ele.
E é justamente aí que Jesus, nos ensina a exercer a nossa missão de dar significado à vivência daqueles que ele se coloca ao lado, hoje, os excluídos da vida e da esperança.
19b Ele lhes responderam: O que concerne a Jesus de Nazaré, que foi um profeta poderoso em atos e palavras diante de Deus e diante de todo o povo :20 como os nossos sumos sacerdotes e os nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte e o crucificaram; 21 quanto a nós, nós esperávamos que ele seria o que devia libertar Israel. Mas, com tudo isso ,já é o terceiro dia que esses fatos se deram. Entretanto, algumas mulheres, que são dos nossos, nos assustaram: tendo ido de madrugada ao túmulo 23 e não tendo encontrado o seu corpo, elas vieram dizer que tinham tido mesmo a visão de anjos que declararam estar ele vivo. 24 Alguns de nossos companheiros foram ao túmulo e o que acharam era conforme o que as mulheres haviam dito; quanto a ele, porém, não o viram.
Os caminheiros de Emaús falam da experiência que brota da vida e como falam! E o mestre os escuta com interesse. Suas esperanças frustradas, decepções no que tange à libertação esperada. , o poder opressor político e religioso continuam presente. A libertação está demorada. Cristo não significou isto que falava. “Acusam-o” de não cumpridor das promessas. São incapazes de reconhecer a novidade do anúncio feito pelas mulheres e confirmada pelos companheiros. Todo o cenário e modelo de sociedade está espelhado nesta fala dos discípulos. Aparecem elementos: sócio-político-econômico e cultural. E é ai retratada a sociedade na qual viveu Jesus.
25 Ele então lhes disse: Espíritos sem inteligência, corações tardos para crer tudo o que os profetas declararam! 26 Não era preciso que o Cristo sofresse isso para entrar na sua glória ? 27 E começando por Moisés e todos os profetas ,ele lhes explicou em todas as Escrituras o que lhe concernia.
Agora é a vez de Jesus! O mestre, as vezes, deve corrigir equívocos com brandura e ternura e é isso que Jesus emprega quando diz: “Espíritos sem inteligência, corações tardos para crer tudo o que os profetas declararam!” O objetivo desta rudeza humana de Jesus seria: tirá-los de sua apatia, de sua falta de esperança, relembrando-lhes o que falava em seu convívio anterior com eles. Uma chacoalhada.
Já podemos aprender algo da caminhada até aqui. Primeiro a vida e agora a Bíblia. Na proposta pedagógica de Jesus, não começa pela Bíblia, esta é ato segundo. Começa pela escuta, a escuta da realidade dos caminheiros de Emaús a partir da experiência vivida. Outro fato interessante é a redescoberta do valor da história. História da vida da comunidade da qual pertenciam os caminheiros de Emaús. E com estas duas ferramentas Bíblia e História, Jesus procura desvendar os olhos dos caminheiros de Emaús. Jesus utiliza alguns textos do Antigo testamento para iluminar a mente de Cléofas e Maria no caminho de Emaús. Não toda a Bíblia, mas um conjunto de textos básicos (Pentateuco, os Profetas e Livros históricos). Não é seletivo e utiliza a Bíblia com a finalidade de reacender a chama da consciência dos discípulos.
28 Eles se aproximaram da aldeia para onde se dirigiam, e ele fingiu que ia prosseguir. 29 Os dois insistiram com ele, dizendo: Fica conosco, pois a tarde está caindo e o dia já começa a declinar. E ele entrou para ficar com eles. 30 Ora, quando se pôs à mesa com eles, tomou o pão, pronunciou a bênção, partiu-o e lhes deu .31 Então os seus olhos se abriram e eles o reconheceram, depois ele se lhes tornou invisível. 32 E disseram-se um ao outro: Não ardia em nós o nosso coração quando ele nos falava no caminho e nos explicava as Escrituras?
Após Jesus ter exposto toda a história da Salvação, com certeza longo tempo de conversa, talvez o caminho inteiro neste diálogo, o casal de Emaús não o reconhece e se mantém de olhos fechados. Chegando ao final do caminho Jesus faz de conta que vai mais adiante. Para a alegria e felicidade nossa, o casal de Emaús o convida para ficar com eles Acolher a um estrangeiro é sinal de sensibilidade, é gesto de solidariedade. É caridade e prática humanitária. Em nosso cotidiano é comum encontrar pessoas que gostaríamos que tivessem tempo para estar com a gente e insistentemente às convidamos. Mas raramente se tem tempo. Ainda mais neste tempo, em que capitalistamente se pensa ‘tempo é dinheiro’, perder tempo é perder a oportunidade de ser. Pois hoje, só é quem tem. Jesus aceita o convite? Claro que sim, parece ser tudo o que desejaria para na mesa dar a última cartada. Queria que seus discípulos e discípulas dessem nova vitalidade à sua presença ressurreta na vida e no ser da comunidade. Jesus de novo toma a iniciativa. Na verdade sempre é Deus que vem ao nosso encontro, precisamos deixar que ele nos encontre com os olhos abertos. E a abertura dos olhos só se dá na partilha do pão. Devemos ser capazes de gestos libertadores e práticas evangelizadoras. A partilha do pão é o convite forte à gestação de uma globalização da solidariedade. Faz-nos supor que, Jesus parte do seu pão, daquilo que traz para a viagem, pois quem deveria servir algo é quem hospeda, mas é Jesus que faz isso. Ele é o pão vivo descido do céu. Sinal de vida e esperança para todos os necessitados e excluídos do sistema. Na encruzilhada sempre nos deparamos com a possibilidade de optar entre o caminho da vida e o caminho da morte. Jesus deu àquele casal a vitalização, a coragem, a força, o dinamismo,... saíram embestados pela estrada escura só iluminados pela chama da certeza de que Jesus vive e nos envia, encoraja, anima.
Depois que Jesus lhes partilha o pão desaparece da frente deles. Para onde Jesus foi?... Ao comungarmos Jesus se torna presente em cada um de nós e sua força nos torna atualizadores de seus gestos e de sua prática. Jesus é encorajamento e nos faz destemidamente voltar para o lugar da morte, da opressão. E ali, destemidamente, assumir o compromisso profético de anunciar o Evangelho com nossa própria vida. É Cristo dentro de nós que nos impulsiona para a missão de anunciar o Reino inaugurado na pessoa dele.
A Bíblia é importante, fundamental no processo de transformação da realidade. Nos dá força, coragem, indica veredas, aponta rumos e suscita esperanças. Mas não muda nada, ela esquenta o coração. “Não ardia em nós o nosso coração quando ele nos falava no caminho e nos explicava as Escrituras?” Com o coração em chamas é preciso experimentar a verdade da solidariedade – gesto de comunhão tão necessário hoje neste tempo de globalização. Comunhão de vida e de destino. Comunhão de compromisso com a causa da comunidade. Que reza, celebra, e que precisa de uma metanóia profunda. Nossos ritos, celebrações devem ser sinal de vida e de esperança. E aqui penso nas nossas celebrações eucarísticas, que se iniciam sempre com mea culpa, e ao redor da mesma mesa oprimidos e opressores partilha o pão libertador de Jesus Cristo. E, na realidade, nada se modifica no cotidiano da vida. Continua a pobreza, a miséria de muitos e a riqueza de poucos... É preciso que nossa prática eucarística reinvente a igualdade numa realidade agápica. Muitas de nossas conquistas nas comunidades são fruto de uma compreensão eucarística além do templo. A extensão desta prática é necessária no cotidiano da vida. Só assim teremos motivações vitais de celebrar a partilha concretizada em gestos transformadores. A presença real de Jesus na Eucaristia se concretiza nas nossas “presenças reais” de seus seguidores no cotidiano da vida.
33 No mesmo instante, eles partiram e voltaram para Jerusalém; encontraram os Onze e seus companheiros.
Jerusalém que era o lugar do medo, da tristeza e desespero. Jerusalém tem uma outra face, transforma-se em local de comunicar a coragem, a alegria e a esperança que não decepciona. É o local do encontro da comunidade dos discípulos de Jesus, até a vinda do paráclito. Da noite escura resplandecente de luz interior iluminam o caminho de volta para confirmar a fé da Comunidade.
34 que lhes disseram: É verdade! O Senhor ressuscitou e apareceu a Simão.
Confirmar a fé da Comunidade é importante. A Comunidade é um grupo de pessoas que crêem. Mesmo sabendo de suas limitações como discípulos Jesus confia-lhes a missão. Se olhasse apenas os limites de seus discípulos que na hora “H” um traiu, outro negou e o resto fugiu, seu projeto teria sucumbido.
35 E eles contaram o que se passara no caminho e como eles o haviam reconhecido na fração do pão.
O testemunho dos fatos demonstram que Cristo vive e é presente, quando reunidos em seu nome continuarmos a missão dele, fazendo acontecer o Reino da igualdade e da vida. É através das Escrituras que descortinamos a Revelação de Deus, nela alimentamos a fé e nossa práxis, nosso quefazer teológico pastoral.
Vida-Bíblia-realidade: pressupostos básicos para uma redescoberta da pedagogia do caminho de Emaús.
E daqui algumas lições importantes: é preciso ir além de conhecer por conhecer a Bíblia. É necessário Deus transformar a nossa vida. Da vida é que se vai para a Bíblia; busca-se ali na Palavra o que melhor ilumine nossa situação de vida; e então volta-se à vida, para transformá-la. A Bíblia tem a função de tornar a vida mais digna e mais humana. Em função disso que procuramos sempre a conhecer mais. Nela encontramos a orientação para a nossa vida, a luz para a realidade que vivemos, coragem e força para soluções de problemas emergentes.
Hoje, os homens e as mulheres se parecem com os caminhantes que iam, na tarde da Páscoa, para Emaús. Decepcionados, conversavam entre si sobre seus desenganos, sobre as esperanças frustradas. Não é esta a mesma conversa do povo hoje? Esperávamos por um progresso econômico, e vemos a situação pessoal piorar; esperávamos por saúde, e vemos voltarem antigas doenças – dadas como exterminadas para sempre; esperávamos por paz e convivência fraterna, e somos atingidos pela violência que não escolhe suas vítimas e nos torna inseguros; esperávamos por uma administração pública eficiente e honesta, atenta às necessidades do povo, como lhe foi prometido, e notamos a cada dia que na política prevalecem os interesses de poucos, dos que já tudo tem e querem aumentar ainda mais seu patrimônio, a custa da exclusão de muitos; esperávamos por cristãos mais fiéis ao Evangelho, mais empenhados no serviço aos irmãos, mais abertos ao diálogo, e encontramos frieza e pouca fé... Desconfiamos, às vezes, até de Deus, como o salmista: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”[3] Como pode Deus permitir a crucifixão de tantos irmãos?
Como anunciar a ressurreição dentro desta situação de morte? A caminhada de Emaús é a caminhada de todos nós, pois da decepção emerge o fogo abrasador da redescoberta da vida e da esperança impulsionadora àqueles a se deslancharem no serviço do Kerygma – anunciar a presença animadora de Jesus.
Na modernidade, havia a esperança do cumprimento de todas as suas utopias: igualdade, fraternidade e liberdade. Estes sonhos ficaram frustrados e se tornam ainda mais obsoletos e impossíveis de concreção. É um absurdo a existência de fenômenos que poderiam ser erradicar de nosso meio tais como a fome, doenças, miséria, desemprego. Coisas superáveis se houvesse uma melhor distribuição dos recursos – no Brasil e no mundo.
Nesta caminhada difícil de ser assimilada e compreendida muitas vezes tentamos esquecer nossos dramas em satisfações paliativas de extravasação da tensão em: diversão, jogo, álcool, drogas... Mas também, com maior empenho nos últimos anos, as pessoas procuram resposta e caminho na filosofia, nas religiões, em diversas formas de espiritualidade. Nós, cristãos, redescobrimos de maneira nova a Palavra de Deus e a presença viva de Cristo. Percebemos que as muitas ideologias alternativas ao cristianismo, que inspiraram projetos nobres, mas também conduziram às piores tragédias da história em nosso século, deixaram ainda mais claro que Cristo é, para a humanidade de hoje, o Caminho, a Verdade e a Vida[4].
A cristianização do cosmo, do ser humano e da sociedade deve ser o que o cristianismo propõe. Anunciamos não uma verdade abstrata, uma mera doutrina, mas acreditamos na presença de Alguém que caminha conosco, mesmo que às vezes nossos olhos não o reconheçam. Nossos olhos se abrem, quando o reconhecemos no “menor dos irmãos” que nos pede pão, água, roupa, casa, assistência médica, segurança e justiça ou, simplesmente, uma atenção, uma visita. É quando os caminhantes de Emaús convidam o desconhecido a sentar-se à mesa com eles, a partilhar a ceia, que seus olhos se abrem. O mesmo acontece hoje, quando esta ceia é celebrada como Eucaristia, agradecendo ao Pai pela entrega do próprio Cristo Jesus, que se oferece por nós e nos alimenta, na jornada, com o dom do Pão e do Vinho, vivendo este momento histórico de bastante complexidade – contraditória e fragmentada. É-nos muito difícil compreender os rumos da história atual ou fazer julgamentos corretos. Nasce, em muitos, a sensação de incerteza, muitas vezes de desorientação, da qual procuram fugir, “simplificando” a realidade, considerando apenas alguns aspectos da mesma, criando esquemas ou imagens simplistas do que está acontecendo. Mesmo assim, é necessário esforço para situar nosso contexto, dentro de um quadro mais amplo, visto que a “globalização” aumenta sempre mais as influências externas sobre a realidade em que vivemos.
Quando a humanidade descobre e pratica a solidariedade e a partilha, já está movida pelo Espírito de Jesus. Já reencontrou a esperança. Já está acolhendo o “Reino de Deus” e começando a superar as decepções e suas causas.
No meio da humanidade, solidários com ela, estão os discípulos e as discípulas de Cristo. São aqueles que, tendo reconhecido o Cristo caminhando ao seu lado, correm para anunciar aos irmãos e irmãs que o Cristo ressuscitado está vivo no meio de nós.
Os cristãos são, no mundo, portadores da esperança: de que a morte do Justo não é a última palavra da história, pois o amor do Pai o ressuscitou; de que Deus há de ressuscitar “nossos pobres corpos mortais”; de que o nosso futuro está no Reino de Deus, na afirmação do seu governo na história do mundo, enfim purificada de todo o mal.
A esperança, porém, não aliena os cristãos dos outros homens e mulheres. Ao contrário, torna-os ainda mais solidários. “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo. Não se encontra nada verdadeiramente humano que não lhes ressoe no coração”[5]. “A esperança de uma nova terra, longe de atenuar, antes deve impulsionar a solicitude pelo aperfeiçoamento desta terra. O progresso terreno... é de grande interesse para o Reino de Deus”[6].
Por isso, o cristão “levanta a cabeça” e olha a realidade do mundo com realismo e com esperança. Procura reconhecer nele os sinais da vontade de Deus e os caminhos que apontam para o Reino, assim como distinguir os obstáculos e as forças do mal que impedem a sociedade humana de avançar na direção da justiça e da paz na aproximação da libertação que se aproxima[7], mas não deixa de “pôr as mãos no arado” ou na foice, não pára de trabalhar para alimentar a família humana, nem deixa de ser o “administrador fiel” dos bens que Deus lhe confiou, a serviço de irmãos e irmãs. Cumpre cada cristão uma missão especial dentro da comunidade que participa. Em todos os segmentos pastorais faz-se necessário um discernimento dos desafios, percebendo as luzes e as sombras, os sinais da graça e as seqüelas do pecado. Todos nós precisamos nos esforçar, iluminados pela fé, para compreender a realidade e buscar caminhos. O cristão eleva seu coração a Deus na oração, de onde haure luz para discernir os caminhos de segurança e justiça e da paz no mundo humano, como centelha do Reino que há de vir.
Jesus age com a “santa ignorância”, assume uma postura pedagógica diferente da convencional – excludente e competitiva. E é justamente aí que aparece a sabedoria de Jesus. Jesus sabia? Sim! Mas, a partir de si e não a partir da experiência daquelas pessoas. E sabemos disso, dependendo do lugar e situação vivencial vemos determinadas coisas e ou acontecimentos de maneira diferente. Num processo dialógico é necessário o saber daqueles com os quais estamos dialogando. 19 Que foi?, disse ele.
E é justamente aí que Jesus, nos ensina a exercer a nossa missão de dar significado à vivência daqueles que ele se coloca ao lado, hoje, os excluídos da vida e da esperança.
19b Ele lhes responderam: O que concerne a Jesus de Nazaré, que foi um profeta poderoso em atos e palavras diante de Deus e diante de todo o povo :20 como os nossos sumos sacerdotes e os nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte e o crucificaram; 21 quanto a nós, nós esperávamos que ele seria o que devia libertar Israel. Mas, com tudo isso ,já é o terceiro dia que esses fatos se deram. Entretanto, algumas mulheres, que são dos nossos, nos assustaram: tendo ido de madrugada ao túmulo 23 e não tendo encontrado o seu corpo, elas vieram dizer que tinham tido mesmo a visão de anjos que declararam estar ele vivo. 24 Alguns de nossos companheiros foram ao túmulo e o que acharam era conforme o que as mulheres haviam dito; quanto a ele, porém, não o viram.
Os caminheiros de Emaús falam da experiência que brota da vida e como falam! E o mestre os escuta com interesse. Suas esperanças frustradas, decepções no que tange à libertação esperada. , o poder opressor político e religioso continuam presente. A libertação está demorada. Cristo não significou isto que falava. “Acusam-o” de não cumpridor das promessas. São incapazes de reconhecer a novidade do anúncio feito pelas mulheres e confirmada pelos companheiros. Todo o cenário e modelo de sociedade está espelhado nesta fala dos discípulos. Aparecem elementos: sócio-político-econômico e cultural. E é ai retratada a sociedade na qual viveu Jesus.
25 Ele então lhes disse: Espíritos sem inteligência, corações tardos para crer tudo o que os profetas declararam! 26 Não era preciso que o Cristo sofresse isso para entrar na sua glória ? 27 E começando por Moisés e todos os profetas ,ele lhes explicou em todas as Escrituras o que lhe concernia.
Agora é a vez de Jesus! O mestre, as vezes, deve corrigir equívocos com brandura e ternura e é isso que Jesus emprega quando diz: “Espíritos sem inteligência, corações tardos para crer tudo o que os profetas declararam!” O objetivo desta rudeza humana de Jesus seria: tirá-los de sua apatia, de sua falta de esperança, relembrando-lhes o que falava em seu convívio anterior com eles. Uma chacoalhada.
Já podemos aprender algo da caminhada até aqui. Primeiro a vida e agora a Bíblia. Na proposta pedagógica de Jesus, não começa pela Bíblia, esta é ato segundo. Começa pela escuta, a escuta da realidade dos caminheiros de Emaús a partir da experiência vivida. Outro fato interessante é a redescoberta do valor da história. História da vida da comunidade da qual pertenciam os caminheiros de Emaús. E com estas duas ferramentas Bíblia e História, Jesus procura desvendar os olhos dos caminheiros de Emaús. Jesus utiliza alguns textos do Antigo testamento para iluminar a mente de Cléofas e Maria no caminho de Emaús. Não toda a Bíblia, mas um conjunto de textos básicos (Pentateuco, os Profetas e Livros históricos). Não é seletivo e utiliza a Bíblia com a finalidade de reacender a chama da consciência dos discípulos.
28 Eles se aproximaram da aldeia para onde se dirigiam, e ele fingiu que ia prosseguir. 29 Os dois insistiram com ele, dizendo: Fica conosco, pois a tarde está caindo e o dia já começa a declinar. E ele entrou para ficar com eles. 30 Ora, quando se pôs à mesa com eles, tomou o pão, pronunciou a bênção, partiu-o e lhes deu .31 Então os seus olhos se abriram e eles o reconheceram, depois ele se lhes tornou invisível. 32 E disseram-se um ao outro: Não ardia em nós o nosso coração quando ele nos falava no caminho e nos explicava as Escrituras?
Após Jesus ter exposto toda a história da Salvação, com certeza longo tempo de conversa, talvez o caminho inteiro neste diálogo, o casal de Emaús não o reconhece e se mantém de olhos fechados. Chegando ao final do caminho Jesus faz de conta que vai mais adiante. Para a alegria e felicidade nossa, o casal de Emaús o convida para ficar com eles Acolher a um estrangeiro é sinal de sensibilidade, é gesto de solidariedade. É caridade e prática humanitária. Em nosso cotidiano é comum encontrar pessoas que gostaríamos que tivessem tempo para estar com a gente e insistentemente às convidamos. Mas raramente se tem tempo. Ainda mais neste tempo, em que capitalistamente se pensa ‘tempo é dinheiro’, perder tempo é perder a oportunidade de ser. Pois hoje, só é quem tem. Jesus aceita o convite? Claro que sim, parece ser tudo o que desejaria para na mesa dar a última cartada. Queria que seus discípulos e discípulas dessem nova vitalidade à sua presença ressurreta na vida e no ser da comunidade. Jesus de novo toma a iniciativa. Na verdade sempre é Deus que vem ao nosso encontro, precisamos deixar que ele nos encontre com os olhos abertos. E a abertura dos olhos só se dá na partilha do pão. Devemos ser capazes de gestos libertadores e práticas evangelizadoras. A partilha do pão é o convite forte à gestação de uma globalização da solidariedade. Faz-nos supor que, Jesus parte do seu pão, daquilo que traz para a viagem, pois quem deveria servir algo é quem hospeda, mas é Jesus que faz isso. Ele é o pão vivo descido do céu. Sinal de vida e esperança para todos os necessitados e excluídos do sistema. Na encruzilhada sempre nos deparamos com a possibilidade de optar entre o caminho da vida e o caminho da morte. Jesus deu àquele casal a vitalização, a coragem, a força, o dinamismo,... saíram embestados pela estrada escura só iluminados pela chama da certeza de que Jesus vive e nos envia, encoraja, anima.
Depois que Jesus lhes partilha o pão desaparece da frente deles. Para onde Jesus foi?... Ao comungarmos Jesus se torna presente em cada um de nós e sua força nos torna atualizadores de seus gestos e de sua prática. Jesus é encorajamento e nos faz destemidamente voltar para o lugar da morte, da opressão. E ali, destemidamente, assumir o compromisso profético de anunciar o Evangelho com nossa própria vida. É Cristo dentro de nós que nos impulsiona para a missão de anunciar o Reino inaugurado na pessoa dele.
A Bíblia é importante, fundamental no processo de transformação da realidade. Nos dá força, coragem, indica veredas, aponta rumos e suscita esperanças. Mas não muda nada, ela esquenta o coração. “Não ardia em nós o nosso coração quando ele nos falava no caminho e nos explicava as Escrituras?” Com o coração em chamas é preciso experimentar a verdade da solidariedade – gesto de comunhão tão necessário hoje neste tempo de globalização. Comunhão de vida e de destino. Comunhão de compromisso com a causa da comunidade. Que reza, celebra, e que precisa de uma metanóia profunda. Nossos ritos, celebrações devem ser sinal de vida e de esperança. E aqui penso nas nossas celebrações eucarísticas, que se iniciam sempre com mea culpa, e ao redor da mesma mesa oprimidos e opressores partilha o pão libertador de Jesus Cristo. E, na realidade, nada se modifica no cotidiano da vida. Continua a pobreza, a miséria de muitos e a riqueza de poucos... É preciso que nossa prática eucarística reinvente a igualdade numa realidade agápica. Muitas de nossas conquistas nas comunidades são fruto de uma compreensão eucarística além do templo. A extensão desta prática é necessária no cotidiano da vida. Só assim teremos motivações vitais de celebrar a partilha concretizada em gestos transformadores. A presença real de Jesus na Eucaristia se concretiza nas nossas “presenças reais” de seus seguidores no cotidiano da vida.
33 No mesmo instante, eles partiram e voltaram para Jerusalém; encontraram os Onze e seus companheiros.
Jerusalém que era o lugar do medo, da tristeza e desespero. Jerusalém tem uma outra face, transforma-se em local de comunicar a coragem, a alegria e a esperança que não decepciona. É o local do encontro da comunidade dos discípulos de Jesus, até a vinda do paráclito. Da noite escura resplandecente de luz interior iluminam o caminho de volta para confirmar a fé da Comunidade.
34 que lhes disseram: É verdade! O Senhor ressuscitou e apareceu a Simão.
Confirmar a fé da Comunidade é importante. A Comunidade é um grupo de pessoas que crêem. Mesmo sabendo de suas limitações como discípulos Jesus confia-lhes a missão. Se olhasse apenas os limites de seus discípulos que na hora “H” um traiu, outro negou e o resto fugiu, seu projeto teria sucumbido.
35 E eles contaram o que se passara no caminho e como eles o haviam reconhecido na fração do pão.
O testemunho dos fatos demonstram que Cristo vive e é presente, quando reunidos em seu nome continuarmos a missão dele, fazendo acontecer o Reino da igualdade e da vida. É através das Escrituras que descortinamos a Revelação de Deus, nela alimentamos a fé e nossa práxis, nosso quefazer teológico pastoral.
Vida-Bíblia-realidade: pressupostos básicos para uma redescoberta da pedagogia do caminho de Emaús.
E daqui algumas lições importantes: é preciso ir além de conhecer por conhecer a Bíblia. É necessário Deus transformar a nossa vida. Da vida é que se vai para a Bíblia; busca-se ali na Palavra o que melhor ilumine nossa situação de vida; e então volta-se à vida, para transformá-la. A Bíblia tem a função de tornar a vida mais digna e mais humana. Em função disso que procuramos sempre a conhecer mais. Nela encontramos a orientação para a nossa vida, a luz para a realidade que vivemos, coragem e força para soluções de problemas emergentes.
Hoje, os homens e as mulheres se parecem com os caminhantes que iam, na tarde da Páscoa, para Emaús. Decepcionados, conversavam entre si sobre seus desenganos, sobre as esperanças frustradas. Não é esta a mesma conversa do povo hoje? Esperávamos por um progresso econômico, e vemos a situação pessoal piorar; esperávamos por saúde, e vemos voltarem antigas doenças – dadas como exterminadas para sempre; esperávamos por paz e convivência fraterna, e somos atingidos pela violência que não escolhe suas vítimas e nos torna inseguros; esperávamos por uma administração pública eficiente e honesta, atenta às necessidades do povo, como lhe foi prometido, e notamos a cada dia que na política prevalecem os interesses de poucos, dos que já tudo tem e querem aumentar ainda mais seu patrimônio, a custa da exclusão de muitos; esperávamos por cristãos mais fiéis ao Evangelho, mais empenhados no serviço aos irmãos, mais abertos ao diálogo, e encontramos frieza e pouca fé... Desconfiamos, às vezes, até de Deus, como o salmista: “Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”[3] Como pode Deus permitir a crucifixão de tantos irmãos?
Como anunciar a ressurreição dentro desta situação de morte? A caminhada de Emaús é a caminhada de todos nós, pois da decepção emerge o fogo abrasador da redescoberta da vida e da esperança impulsionadora àqueles a se deslancharem no serviço do Kerygma – anunciar a presença animadora de Jesus.
Na modernidade, havia a esperança do cumprimento de todas as suas utopias: igualdade, fraternidade e liberdade. Estes sonhos ficaram frustrados e se tornam ainda mais obsoletos e impossíveis de concreção. É um absurdo a existência de fenômenos que poderiam ser erradicar de nosso meio tais como a fome, doenças, miséria, desemprego. Coisas superáveis se houvesse uma melhor distribuição dos recursos – no Brasil e no mundo.
Nesta caminhada difícil de ser assimilada e compreendida muitas vezes tentamos esquecer nossos dramas em satisfações paliativas de extravasação da tensão em: diversão, jogo, álcool, drogas... Mas também, com maior empenho nos últimos anos, as pessoas procuram resposta e caminho na filosofia, nas religiões, em diversas formas de espiritualidade. Nós, cristãos, redescobrimos de maneira nova a Palavra de Deus e a presença viva de Cristo. Percebemos que as muitas ideologias alternativas ao cristianismo, que inspiraram projetos nobres, mas também conduziram às piores tragédias da história em nosso século, deixaram ainda mais claro que Cristo é, para a humanidade de hoje, o Caminho, a Verdade e a Vida[4].
A cristianização do cosmo, do ser humano e da sociedade deve ser o que o cristianismo propõe. Anunciamos não uma verdade abstrata, uma mera doutrina, mas acreditamos na presença de Alguém que caminha conosco, mesmo que às vezes nossos olhos não o reconheçam. Nossos olhos se abrem, quando o reconhecemos no “menor dos irmãos” que nos pede pão, água, roupa, casa, assistência médica, segurança e justiça ou, simplesmente, uma atenção, uma visita. É quando os caminhantes de Emaús convidam o desconhecido a sentar-se à mesa com eles, a partilhar a ceia, que seus olhos se abrem. O mesmo acontece hoje, quando esta ceia é celebrada como Eucaristia, agradecendo ao Pai pela entrega do próprio Cristo Jesus, que se oferece por nós e nos alimenta, na jornada, com o dom do Pão e do Vinho, vivendo este momento histórico de bastante complexidade – contraditória e fragmentada. É-nos muito difícil compreender os rumos da história atual ou fazer julgamentos corretos. Nasce, em muitos, a sensação de incerteza, muitas vezes de desorientação, da qual procuram fugir, “simplificando” a realidade, considerando apenas alguns aspectos da mesma, criando esquemas ou imagens simplistas do que está acontecendo. Mesmo assim, é necessário esforço para situar nosso contexto, dentro de um quadro mais amplo, visto que a “globalização” aumenta sempre mais as influências externas sobre a realidade em que vivemos.
Quando a humanidade descobre e pratica a solidariedade e a partilha, já está movida pelo Espírito de Jesus. Já reencontrou a esperança. Já está acolhendo o “Reino de Deus” e começando a superar as decepções e suas causas.
No meio da humanidade, solidários com ela, estão os discípulos e as discípulas de Cristo. São aqueles que, tendo reconhecido o Cristo caminhando ao seu lado, correm para anunciar aos irmãos e irmãs que o Cristo ressuscitado está vivo no meio de nós.
Os cristãos são, no mundo, portadores da esperança: de que a morte do Justo não é a última palavra da história, pois o amor do Pai o ressuscitou; de que Deus há de ressuscitar “nossos pobres corpos mortais”; de que o nosso futuro está no Reino de Deus, na afirmação do seu governo na história do mundo, enfim purificada de todo o mal.
A esperança, porém, não aliena os cristãos dos outros homens e mulheres. Ao contrário, torna-os ainda mais solidários. “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos os que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo. Não se encontra nada verdadeiramente humano que não lhes ressoe no coração”[5]. “A esperança de uma nova terra, longe de atenuar, antes deve impulsionar a solicitude pelo aperfeiçoamento desta terra. O progresso terreno... é de grande interesse para o Reino de Deus”[6].
Por isso, o cristão “levanta a cabeça” e olha a realidade do mundo com realismo e com esperança. Procura reconhecer nele os sinais da vontade de Deus e os caminhos que apontam para o Reino, assim como distinguir os obstáculos e as forças do mal que impedem a sociedade humana de avançar na direção da justiça e da paz na aproximação da libertação que se aproxima[7], mas não deixa de “pôr as mãos no arado” ou na foice, não pára de trabalhar para alimentar a família humana, nem deixa de ser o “administrador fiel” dos bens que Deus lhe confiou, a serviço de irmãos e irmãs. Cumpre cada cristão uma missão especial dentro da comunidade que participa. Em todos os segmentos pastorais faz-se necessário um discernimento dos desafios, percebendo as luzes e as sombras, os sinais da graça e as seqüelas do pecado. Todos nós precisamos nos esforçar, iluminados pela fé, para compreender a realidade e buscar caminhos. O cristão eleva seu coração a Deus na oração, de onde haure luz para discernir os caminhos de segurança e justiça e da paz no mundo humano, como centelha do Reino que há de vir.
[1] Licenciado em Filosofia e Bacharel em Teologia. Psicopedago e Docente na Rede Estadual de São Paulo e na Faculdade de Educação, Ciências e Artes Dom Bosco (FAECA), Monte Aprazível-SP.
[2] Casaldáliga, D. Pedro & Cirenes Kuha. Peregrinos de Emaús. K7.
[3] Cf. Sl 22,2.
[4] Cf. Jo 14, 6.
[5] Concílio Vaticano II, Constituição “Gaudium et Spes”, 1.
[6] Concílio Vaticano II, Constituição “Gaudium et Spes”, 39b.
[7] Cf. Lc 21,28.
Nenhum comentário:
Postar um comentário