Crise da Modernidade e emergência do pluralismo cultural sob a ótica
antropológica, filosófica e teológica.
Prof.
José Igídio dos Santos*
Resumo
Este artigo visa refletir sobre a Modernidade e a emergência do
pluralismo cultural sob a ótica antropológica, filosófica e teológica. Estas
conjecturas reflexivas originam-se dos seguintes ambientes de análise: as
comunidades eclesiais e as instituições educacionais.
A
contextualização é muito importante numa reflexão. Neste propósito, é
imprescindível adotar uma postura aberta na compreensão do momento presente,
com os dramas e tramas que a realidade impõe. É notável a mudança cultural que
é sentida de geração em geração.
A reflexão sobre a modernidade
impõe aos seres humanos uma perspectiva educacional que convida a adotar uma
hermenêutica antropológica e cultural que consolide um projeto
educacional-transformador. A nosso ver este projeto deveria visar a
recuperação da cultura do povo brasileiro. Neste ínterim, notamos em sentido “lato”, que as instituições religiosas
têm deixando de ter incidência sobre a realidade vivencial das pessoas e que as
instituições educacionais, no prospecto presente, não conseguem trabalhar a
totalidade do ser humano.
Vemos que, com o pluralismo religioso, houve uma migração do espaço
institucional para o âmbito individual. Desta forma, desvincula a experiência
transcendental de instituições religiosas. Dito de outra forma, o espaço
religioso vem migrando do âmbito institucional (objetivo) para o âmbito
individual (subjetivo). Nota-se que a instituição religiosa deixa de ter
preferência face às muitas opções da vida cultural emergente. A experiência
institucional da religião deixa de ser a única resposta de fé para o homem
moderno, pois, este a busca em uma espiritualidade transcendente que está além
dos espaços institucionais. Essa evidência nos questiona sobre a incidência, ou
não, dos fenômenos religiosos e das mediações institucionais no fundamento da
fé dos modernos. No entanto, é necessário contextualizar-nos e, no âmbito educacional,
compreender o momento presente em vista de realizar um projeto antropológico
que responda aos anseios dos homens e mulheres de nosso tempo. Portanto, é
tarefa da educação despertar nos seres humanos uma melhor consciência das
mutações históricas e antropológicas do momento atual.
Palavras chave: modernidade, cultura, educação,
religião, filosofia, teologia.
Abstract
This article aims at reflecting on
the Modernity and the emergency of cultural pluralism under the
anthropological, philosophical and theological optics. These reflexive
conjectures arise from the following environments of analysis: the ecclesiastic
communities and the educational institutions.
The contextualization is very important on a reflection.
For this purpose, it is essential to adopt an opened position in the
understanding of the present moment, with the dramas and schemes that the
reality imposes. It is remarkable the cultural change that is felt from
generation to generation.
The reflection on modernity imposes
on human beings an educational perspective that invites us to adopt an
anthropological and cultural hermeneutics that consolidates an
educational-transforming project. From our point of view this project should
aim at the recovery of the culture of the Brazilian people. In this meantime,
we notice in “lato sensu”,
that the religious institutions have been leaving to have incidence on the
existential reality of the people and that the educational institutions in the
present prospect can not work the totality of the human being.
We see that with the religious
pluralism there was a migration from the institutional space to the individual
scope. In this manner, it disentails the transcendental experience of religious
institutions. In other words the religious space is migrating from the
institutional scope (objective) to the individual scope (subjective). It has
been noticed that the religious institution leaves off having the preference in
view of many options of the emerging cultural life. The institutional
experience of the religion leaves off being the only answer of faith for the
modern man since he is searching for this in a transcendental spirituality that
it is beyond the institutional spaces. This evidence asks us about the
incidence, or not, about the religious phenomena and the institutional
interventions in the foundation of the faith of the modern ones. However, it is
necessary to contextualize ourselves and, in the educational scope, to
understand the present moment in order to carry out an anthropological project
that answers the wishes of the men and women of our time. Therefore, it is the
task of the education to awaken human beings to a better conscience of the
historical and anthropological mutations of the current moment.
Words key:
modernity, culture, education, religion, philosophy, theology.
1.
Compreendendo a Modernidade
A modernidade
é uma categoria de leitura do tempo histórico. Cabe a nós um alerta: ter o
cuidado para utilizar uma forma coerente às categorizações do tempo, mantendo
uma postura hermenêutica crítica face à realidade do cotidiano. Sabemos que,
para conhecer esta realidade, é necessária uma perspectiva analítica do tempo
presente. Portanto, nunca podemos julgar o passado com as categorias de análise
que utilizamos na atualidade; se assim o fizéssemos cairíamos sempre numa
postura moralista da história agindo como juízes do tempo, condenando o passado,
sem o mínimo de respeito às categorias mentais em que os fatos aconteceram. No
entanto, olhar o passado sempre nos faz atentar mais para o tempo presente em
vista de descortinar novas prospectivas de futuro. Vivendo na modernidade,
reportamos ao passado, sem anacronismo, e descortinamos nesta retrospectiva uma
atitude fundamental para a história: a consciência de que aprendemos com os
erros e podemos redirecionar nossas opções históricas para que o futuro não nos
atemorize. Desta forma podemos perceber que a modernidade, com todos os seus
pressupostos, entrou em convulsão por falta de cuidado com o ser humano.
Sabemos que, na contemporaneidade histórica, o presente de nossa história está
em crise de paradigmas, crise de perspectivas e podemos constatar que existe um
mosaico a ser construído com nossas experiências. Hoje, com facilidade,
identificamos atitudes que mesclam atraso e progresso e como alerta podemos
constatar que nem tudo que é tecnicamente
viável é eticamente aceitável; nem sempre o moderno significa avanço
humanitário. Na modernidade há uma novidade contrastante entre antiquado e o
desumano; e temos a sensação de que o novo da modernidade está sempre
travestido de algo que já existia.
A modernidade
hoje se caracteriza como um processo de mudança civilizatória em nossa
sociedade, decodificada por uma “mudança de época”, que é abrangente e atinge
todas as dimensões da vida humana, do nascer ao morrer; modifica as relações
culturais e abarca os aspectos: sócio, político, econômico e cultural. Erigido sob a égide da emancipação do ser
humano, é ancorado no tripé: liberdade, felicidade e racionalidade. E
aqui cito Libâneo, um dos teólogos mais ‘antenados’ no tempo e que soube
trabalhar a realidade contemporânea no contexto sócio-histórico-cultural, sem
deixar de lado o elemento da crítica, que nos diz:
“Na modernidade, com seu tríplice discurso da liberdade,
felicidade e razão, não há lugar para os pobres. A liberdade dos pobres é
formal. “Podem’ ter acesso a todos os bens de consumo materiais, artísticos.
Não são proibidos por nenhuma lei. Mas não dispõem de dinheiro, escolaridade,
saúde que lhes permitam ter esse acesso, e usufruir dessa liberdade. E sobre o
tema liberdade, monta-se a imensa máquina ideológica capitalista. Cria-se esta
gigantesca ilusão. ... O discurso da felicidade é ainda mais enganador. As
propagandas, os programas de TV, a inundação de imagens, que gritam por todos
os lados por prazer, por gozo, por satisfações, terminam ou açulando desejos,
impossíveis de serem satisfeitos, ou desencaminhando-os para labirintos
tortuosos do vício, da criminalidade, da pornografia desenfreada. Cria-se a
felicidade dos grandes centros, à custa de enorme miséria, sofrimento,
privações, humilhações, degradações humanas. O discurso da racionalidade, que
se nutre do estudo, da pesquisa, da ciência, esbarra contra o analfabetismo, a
evasão escolar, a impossibilidade de uma escolaridade estruturada,
progressiva. ... Os pobres nessa
modernidade do discurso, da palavra lida e escrita, da força do dinheiro, do poder,
do prestígio e do “status”, do culto da forma e da beleza, estão excluídos. ...
A modernidade nos países pobres só tem de universal o discurso. A prática é
seletiva, excludente, privilegiante, parcial”( Libânio, 1992, p. 153).
1.1 - Multifaces da modernidade:
A modernidade possibilitou o avanço tecnológico e em face dessa
realidade, emergem movimentos de volta ao sagrado, considerados uma reação de
busca ao sentido da vida associado ao vazio existencial dos homens e mulheres
nos tempos de (pós) modernidade. Essa crise de sentido é muito complexa, nem
sempre é uma realidade consciente.
Ademais, há uma notável emergência do feminino. Surgem movimentos e
grupos com a bandeira da resistência colocando em xeque a histórica hegemonia
masculina.
É perceptível e fundante a contribuição do status moderno à revolucionária
emergência da informatização que está revolucionando a comunicação pessoal
estabelecendo novas perspectivas que nos permite passar facilmente do plano
pessoal ao coletivo e deste ao laborativo (internet) (cf. Moran,1998).
Com o advento da informatização, o chamado fenômeno da globalização ou
planetarização ganhou espaço principalmente no mercado, na economia, que
on-line possibilita um universo plural de possibilidades a compradores e
vendedores agora facilitados com o uso dos cartões de crédito para o consumo de
bens duráveis ou fungíveis.
No âmbito ecológico é importante a emergência de uma nova consciência planetária
que busque cuidar da natureza enfatizando o enlace existente entre todos os
seres naturais, minerais, cósmicos – numa rede de relações que formem uma teia
de relações interdependentes. Esta nova concepção ecológico-planetária deverá
modificar nossa concepção de cultura, passando da perspectiva exploradora para
uma nova perspectiva cultural macro-ecológica que vise o estabelecimento de
redes de relações, de interdependências entre todos os seres. Esta forma de ver
a realidade vem consolidando como novo paradigma deste momento (pós) moderno com
o embasamento da teoria dos sistemas vivos que possibilita a emergência de uma
nova proposta que passa da ontogênese
para a antropogênese ecológica em vista da consolidação de uma
nova consciência planetária. O planeta e a vida estão ameaçados pelo descaso
com a nossa mãe-terra e com o universo (cf. Boff, 2004,320p.)
1.2 –
Interfaces da Modernidade
Neste subtítulo veremos as interfaces da modernidade mostrando alguns
aspectos contraditórios em vista da crítica ao pensamento técnico-científico
com elementos excludentes que são aqui analisados através da racionalidade filosófica-crítica:
·
A
automação das empresas que utilizam as máquinas ou robôs excluindo o ser humano
do processo de produção, personificando na robotização os seres humanos em
vista da produção, do lucro; com isso aumenta o desemprego, pois a mão de obra
humana é desnecessária na produção em grande escala. Por conta disso, o
desenvolvimento técnico-científico vem atrelado ao desrespeito à ordem natural,
ao planeta e às relações humanas que, em última instância, incide na violência
institucionalizada, no narcotráfico e no crime organizado.
·
A
fragmentação da sociedade no âmbito econômico, social, político e cultural
incide nas mutações dos paradigmas perceptível em todos os aspectos, mas é sentida
de forma muita acentuada no processo de desestruturação das famílias
tradicionais face às dificuldades oriundas da adaptação ao novo contexto
emergente (falta de contatos humanos, de condições sócio-econômicas e
culturais). Emergem novos modelos de famílias em que, no momento, não há uma
classificação, mas existem estudos recentes buscando a compreensão das famílias
modernas.
·
Dentro
do aspecto antropológico, existe a tendência ideológica de fragmentação do ser
humano e, em contrapartida, há uma proposta integradora emergente que propõe
uma perspectiva holística que visa “cuidar do homem todo e de todos os homens”.
Já que a totalidade e a plenitude dos seres humanos, em conexão com o cosmo,
fundamentam a missão do tempo presente em vista de uma esperança de vida no
futuro.
·
A
crítica ao avanço técnico-científico se incide na falta de cuidado com a
natureza, e como antídoto a essa inconsciência, é necessário uma compreensão da
natureza como um organismo vivo que quer viver para nos dar vida com qualidade.
·
É
necessária uma crítica à intolerância, ao dogmatismo, tendo, como via de
abertura, a compreensão da relacionalidade entre o pluralismo filosófico
contextualizado historicamente, este pluralismo
social auxilia de forma comparativa a descoberta do melhor modelo de
sociedade, pluralismo político capaz
de impetrar atitudes cívicas e patrícias em vista de administrações políticas
nobres, honestas e menos corruptas e neste ínterim, o aspecto religioso é fundamental na superação da inversão de valores
éticos e morais a que está submetida a humanidade inculcando estes pressupostos
de forma transcendental.
·
Exacerbação
do hedonismo em vista de uma satisfação através de relacionamentos prazerosos
geralmente de âmbito sexual ou erótico, com a colaboração da pornografia
on-line.
·
Contra
o preconceito e o aumento das exclusões étnicas, culturais, econômicas,
políticas são necessárias novas concepções sobre a emergência da eticidade no
âmbito histórico, que visará à consolidação de uma nova forma de convivência
humana, sobretudo, o respeito e consciência de co-responsabilidade histórica.
·
Em
vista da hegemonia do capital - as leis de mercado, com sua forma autoreguladora
da vida social e pessoal propõe um padrão social de consumo às classes
detentoras do poder econômico e, aos demais, o consumo dos bens que o mercado
populariza em vista de atender outra fatia da população de menor poder
aquisitivo. Neste contexto ‘existir é consumir’, você é o limite do seu cartão
de crédito e notamos de forma escandalosa os assédios das operadoras de cartões
de crédito e dos bancos em busca de novos clientes. E a manutenção do
consumismo se dá através do marketing veiculado pelos meios de comunicação de social
(MCS) que incentiva o desejo de compra aos novos consumidores. Quem não tem um
sonho de consumo? ! Não é mesmo!
·
Hoje,
a supremacia do saber científico ocupa um lugar privilegiado na modernidade, o
que se convenciona dizer que 'saber é poder' e a hegemonia do saber é vista
como 'propriedade intelectual' e cada descoberta vai sendo patenteada erigindo assim
a descoberta científica como identidade pessoal do cientista pesquisador; o
saber empírico comprobatório torna-se elemento auto-regulador da ciência e do saber.
1.3 -
Entendendo alguns aspectos da modernidade.
A modernidade é um processo de enorme transformação que contrapõe
normas, deveres, autoritarismo. Ninguém
mais impediu os cientistas de descobrirem. O grande sonho da modernidade - a
liberdade - é colocado em xeque pela história. Não faltam exemplos de nossa insanidade e,
cedo ou tarde, percebemos nosso desvio de conduta e descuido com a vida.
O ano de 1.945, marca a sociedade
livre e destrutiva (bomba atômica). Livre para experimentar suas descobertas.
Destrutiva por não medir as conseqüências, e justamente aí está sua
irracionalidade. Sob a égide da autonomia, a ciência é vítima de sua astúcia
inventiva.
Posso perguntar: em nome da
liberdade posso fazer o que bem entendo?
Se usarmos o bom-senso, vamos
descobrir o valor do consenso. Mas a modernidade acredita que não existem
barreiras para ela. Quer romper recorde. E constitui um projeto luminoso. Como
a ciência, a política e a economia rompem com os vínculos éticos e morais. Tudo
em nome do progresso, que se chama liberdade.
A liberdade se expressa no
desenvolvimento que se chama progresso ilimitado. O único critério é a
possibilidade. Se for possível fazer algo tecnologicamente, então faça! E aí se
justificam todas as espécies de pesquisas científicas, e a que mais vem
preocupando moralistas e teólogos são as pesquisas que se desenvolvem no âmbito
bio-antropológico como a recente pesquisa sobre a clonagem.
No centro da modernidade temos outro sonho: o da igualdade. Quem é que
vai propiciar esta igualdade? - O progresso! Iniciaríamos o século XX
todos com melhores condições de vida. Mas levamos um susto: a sociedade nunca
foi tão desigual. A desigualdade só aumentou. Há muitos bens produzidos
disponíveis no mercado, mas o acesso não é igual para todos. Um dos amargores
do final do milênio.
A modernidade conseguiu mais do que foi imaginado. Nos últimos 50 anos
o progresso foi maior do que no restante da história. Nunca os desejos foram
realizáveis tão rapidamente como hoje.
Mas o sucesso da modernidade é excludente, desigual, desumano!
2. O Brasil
- Espelho do que a modernidade conseguiu:
A
indústria automobilística, de eletro-eletrônicos e de produção de grãos
conseguiu cifras até hoje nunca anunciadas.
Na modernidade
existe uma racionalidade irracional. Explico-me: A modernidade é contraditória:
inventa carros, aviões, realizam cirurgias plásticas, transplantes, etc., e não
sabe lidar com o sofrimento, com a doença, com a morte, com a longevidade.
Por que será que a modernidade não
conseguiu articular liberdade e igualdade?
- Todo esse fracasso é programado ou é conseqüência da modernidade?
A história não é conspiração e nem
eterno retorno, não é anacrônica e diacrônica. O sonho é de liberdade e
igualdade. Não é possível dizer que foi tudo programado. A discussão é
acadêmica e existem diversas correntes.
Existe uma corrente que defende que
a igualdade é um sonho impossível, que as pessoas são fundamentalmente
desiguais. O mundo é constitutivamente desigual. O sonho de igualdade, para
essa corrente, é um sonho irreal.
Procurando entender melhor a
modernidade como processo de transformação, vamos observá-la sob dois aspectos:
as transformações sócio-econômicas e as
transformações ético-cultural.
2.1 -
Grande transformação sócio-econômica
Características
dessa transformação:
2.1.1.
Revolução tecnológica:
a humanidade passou pelas revoluções agrícola e industrial. Hoje vive a
revolução tecnológica, da informática, do conhecimento. Avanço: menos
operários, menor quantidade de máquinas, maior sofisticação e produção. A
capacidade de processar novos conhecimentos e informações, isso faz do
computador um elemento de inovação. Em 1970, uma descoberta na área da
indústria durava dois anos. Nos anos 80, um ano. A partir de 90 a cada seis semanas e nos
bancos a cada 24 horas. (Toffler,
Alvin. 1992. 491p).
Outro elemento que compõe a revolução tecnológica é a capacidade de
transmitir informação - comunicação. O uso do sistema digital (átomos -
substituídos por bytes) agiliza o processo em dez vezes.
2.1.2 - Depreciação das matérias-primas[1]: Nos anos 90 houve uma queda de 40% no custo das matérias primas, 60 %
do custo de um automóvel correspondia à matéria prima e mão-de-obra. Nesta
década passa a ser 10%. Assim o Terceiro Mundo, que possui matérias-primas,
fica descartado. Como reação a isso, temos a preocupação com a agricultura
orgânica, volta às coisas mais naturais.
2.1.3 - O trabalho não é mais
necessário: "Pior
do que ser explorado pelo trabalho é não ser nem mesmo explorável"[2]. O mundo fica mais rico sem tanto
trabalho. A produtividade de um trabalhador hoje é 80 vezes maior que nos anos
40. Os trabalhadores passam por situações de irregularidade. Começa a faltar
trabalho. A questão da qualidade total significa sempre redução de mão-de-obra.
Esta mudança não é periférica, superficial. De repente, estamos num mundo onde
o trabalho não é mais necessário.
Começamos a ter um grupo central que tem um trabalho estável, que está
altamente especializado e é muito bem pago. De outro lado, temos dois subgrupos:
a) Trabalho integral, de rotina. Ex.:
secretária, faxina...
b) Trabalho parcial, terceirização:
alimentação, vigilância...
2.1.4 - O conhecimento: fator de produção decisivo. Hoje a
disputa é para saber quem é o “dono” do conhecimento. Um dos homens mais rico
do mundo, Bill Gates, ocupa 16 mil pessoas em sua empresa de conhecimento
Microsoft. O poder está onde há conhecimento, e a sua manutenção se dá quando
este se torna poder econômico.
2.1.5 - Fluxo financeiro: a modernidade faz com que o dinheiro
seja cada vez mais onipresente, onipotente, imaterial, substituto de Deus. Um
trilhão de dólares circula diariamente pelo mundo de forma abstrata, pelo
simples toque de algumas teclas de computador.
2.2 -
Grande transformação ético-cultural
Desde os gregos até o início da idade moderna havia a visão de que a
pessoa humana só é na medida em que ela participa da polis, da vida da
cidade. A vida da cidade se dá na praça pública, lugar dos discursos. Tomás de
Aquino retoma Aristóteles, dizendo que a pessoa humana é quando é capaz de
amar (Reale,
G. & Antiseri,D., 1990)
Para a modernidade esse discurso já
passou, é moral. Nenhuma sociedade organizou-se economicamente
baseada no Sermão da Montanha de Jesus de Nazaré. A moral sempre vai
defender a partilha, a solidariedade. A modernidade, contrariamente, vai
afirmar que a pessoa por natureza é egoísta, é movida por paixões. A moral
tenta canalizar essas paixões. A modernidade vai raciocinar: - Se nós deixarmos
livres as paixões, como vamos organizar a sociedade? Será que não existe entre
elas uma que consiga dominar todas? Assim é alimentado o individualismo. O
capitalismo nas intenções morais é péssimo. Mas, nos seus resultados, se vê o
crescimento à humanidade.
Notamos que hoje a pessoa humana
está autocentrada, individualista. E isso é característica das mudanças que
vivem. Cada vez mais cresce a crença de que somos pessoas incapazes de fazer o
bem pelo bem: “Eu procurando o meu próprio bem faço bem aos outros”. É uma espécie de moral-privacidade.
Hoje o desejo está em
primeiro lugar. O prazer e o amor tornam-se secundários. Procuram-se meios de
como encantar o cliente. O bem do outro não é o fim. Em vista do meu bem faço o
bem dos outros. Crio desejos. (Novaes, A.(org) O desejo, 1990. 503p).
Nós vivemos numa sociedade do
pós-dever. A renúncia, o sacrifício, o doar-se oblativamente não estão em vigor. Eu ajudo o outro
fazendo aquilo que me dá prazer. Ex.: Tomando uma bebida, ouvindo uma música -
We are the World - ajudo a Etiópia.
Nesta condição de cultura
individualista se melhora a qualidade das relações para mais personalizadas, em
vista de cativar clientes. As normas sociais de conduta não são mais
importantes. O como devo viver torna-se uma questão de gosto, de preferência
individual, ou moral, ou ética, ou religiosa. Vivemos num mundo onde a tudo é
atribuído à relatividade ética. Existem normas tanto quanto existem gostos.
Nada se pode exigir de alguém. E em ninguém se pode reconhecer o direito de
exigir de alguém. Isso significa a suspensão de julgamentos.
Vivemos a solidão[3]. Vivemos num mundo narcísico, no qual
a prioridade do indivíduo é a sua autonomia e o alcance de sua felicidade. O
Ideal de saúde coloca limites a um hedonismo inevitável. Poderá amar só a ti
mesmo, perseguir o teu prazer, mas sob a condição de antes cuidar e manter o
teu corpo. A moral, a norma na modernidade é substituída pelo médico. A
necessidade moral de estar e permanecer em forma conforta cada um no bem
fundado desejo de estar distante dos outros. (cf. Dacquino,G., 1992)[4]. Acontece o sacrifício do corpo para o bem
próprio, eliminando a alteridade[5]( Zimmermann, R., 1987) A modernidade leva a super valorização
do indivíduo.
Assim como afirma Karl Marx.: que “Tudo
o que era sagrado se torna profano, tudo o que é sólido se desmancha no ar”. (Marx, Karl., 1985.).
A felicidade subjetiva irriga a
busca cotidiana. A humanidade não se
dedica em vencer o desejo, o prazer, (Plé, Albert.,1984) [6] ao contrário, os
desculpabiliza; supervaloriza o gozo do presente; o templo do eu se converte
numa nova religião.
2.3.1-Características da transformação ético-cultural:
2.3.1.1 – O Neo-individualismo
Os programas de qualidade total estão na lógica da competição e
da negação do outro. É de novo, inclusão de uns poucos e a conseqüente marginalização
da maioria. A vida social é uma grande “guerra”. Como fazer política numa
sociedade onde o isolacionismo constitui a norma e a forma das pessoas viverem?
Notamos uma baixa ao trabalho associativo, mas existe uma incipiente
consciência que a sobrevivência das comunidades só é possível se houver
parcerias para os trabalhos, buscando a unificação de potenciais.
2.3.1.2 - Substituição
da ética pela estética:
A modernidade é a situação em que a relação interpessoal foi
substituída por uma relação objetal e mercadológica. Tudo foi transformado em
coisa: terra, vida, pessoa. Enfim, em mercadoria. Não
são as pessoas que dizem quanto valem as coisas; mas, as coisas é que dizem
quanto valem as pessoas. Passa a valer o que a pessoa tem e não o que ela é. Em
um último estágio desta realidade as pessoas se tornam ‘coisas descartáveis’.
Daí as exclusões em massa das guerras presenciadas no final do milênio passado
e no início deste. Tantas pessoas se tornaram objetos de perseguição por lutar
por mais justiça social; e, nessa luta, as suas vidas se tornaram “perigosas”
para quem detém o poder e, quase sempre, são eliminadas pelo infortúnio à paz
dos interesses alheios.
Por que diante dos terrorismos, guerras iníquas, narcotráfico,
corrupções, violências, opressões, descaso dos políticos com a coisa pública,
os intelectuais e formadores de opiniões ficam calados? Esta insensibilidade
social só pode ter uma explicação: a coisificação das pessoas. Os direitos
humanos são substituídos pelos direitos hegemônicos dos detentores do poder
político, ideológico e militar.
A tecnologia faz com que nos tornemos distantes uns dos outros, o
relacionamento interpessoal é substituído por outras formas de comunicação
virtual.
A modernidade é caracterizada por sua objetividade e praticidade e
isso dispensa o envolvimento entre as pessoas, procurando sempre formas
virtuais de relação.
Por falta de critérios éticos, concordamos com o que é mais elegante[7]. Os critérios estéticos substituem os
éticos:
Disse Karl Max: “Toda mercadoria é
um mistério”.(
Marx, Karl, 1998, p. 68.)
Ela tem um véu que encobre uma realidade. Esconde as relações sociais que a
produziram. Tocando uma mercadoria estou
tocando em trabalho humano, em sangue, em força humana. Nem sempre podemos
consumir bens que melhoram nossa qualidade de vida, pois, é preciso priorizar a
subsistência e alguns bens e produtos não cabem em nosso poder de compra. Neste
ínterim, a qualidade de vida aos humanos se torna bens de consumo raros,
possível apenas para uns poucos privilegiados.
A sociedade civil começa a se
organizar através de movimentos sociais, tais como: movimentos ecológicos,
feministas e pela ética na economia. Muitas associações e organizações não
governamentais tendem a ser a consciência dos homens que se perderam em face de
uma realidade opressora e que necessita de libertações em diversas perspectivas
e, nesta tarefa, cabe a nós, educadores, desempenhar o papel de despertar, nos
educandos, o desejo de participação ativa e efetiva, provocando em cada agente
da educação a necessidade de uma encarnação real.
O nosso desafio não é entrar na modernidade. Ela já nos envolve.
Estamos na modernidade e, até para alguns, na pós-modernidade (cf. Lyon, David , 1998. p.136)[8]. Como apontar rumos e encontrar
caminhos libertadores? Entre tantos questionamentos feitos, apontamos algumas
vielas nas quais podemos andar sem medo de ser felizes.
Precisamos buscar uma visão teológica:
· Discernimento: conhecer a realidade. Saber escutar e manter o SIM e o
NÃO de Deus na história.
· Conhecer qual o Plano de Deus, o Projeto de Jesus Cristo. Ter
presente as palavras de São Paulo aos Romanos: “Não vos conformeis com este
mundo. Mas transformai vossa mente...”(Rm 12,1-2).
·Manter os valores do Reino: dignidade da pessoa humana, igualdade, partilha,
solidariedade, defesa da vida...
·Tomar consciência de que não precisamos de tudo só porque é possível.
Precisamos desejar o impossível.
·Fortalecer nossos laços comunitários.
·Fazer parcerias com outros setores da sociedade.
3 - A cultura como princípio integrador
do Ser humano.
“No
passado o homem era no mundo apenas um ser entre outros seres. Vivia em contato
íntimo com a natureza e a escutava. Ela o desafiava, mas era também sua
companheira e lhe falava ao coração. Seus valores, suas crenças e suas práticas refletiam esta relação vital.
O cosmo humano era, enfim, bem diferente do atual. O tempo, as ambições, as
conquistas e, talvez, a própria natureza do homem foram, aos poucos, alterando
as relações e a ordem das coisas. Ampliando seus conhecimentos, dominando novas
tecnologias, o homem adquiriu uma autoconfiança desmedida que o separou da
natureza. As revoluções técnico-científicas trouxeram progresso, mas também
destruição ecológica, dominação e violência. Submetida e dessacralizada, a
natureza se calou. Tirano de si mesmo, o homem foi se tornando só”( Coltrin,1993. p.14).
3.1 - O que
quer dizer a palavra cultura?
Para dar vida e esperança ao povo, diante de todo este fenômeno da
modernidade, faz-se necessário redescobrir o valor e a importância da cultura.
Ela é um fator integrador da unidade humana, tão diluída na modernidade com
seus esquemas destrutivos de forma subliminar e inconsciente. Procuremos
compreender sob a ótica dos povos simples buscando uma hermenêutica que parta
de sua realidade vivencial, sabendo que seu dia-a-dia é ultrajado pelo monstro
sistêmico–neoliberal da cultura moderna. Na tentativa de resgatar as dívidas no
campo cultural nos propusemos a refletir a emergência do valor do pluralismo
cultural em nosso meio.
Para
entender a palavra cultura é preciso entender o que é natureza. Como gosto
muito de fotografar, peço que você imagine comigo uma fotografia de uma casa na
roça.
O que aparece na foto? (uma montanha, uma árvore com um banquinho
debaixo, uma ponte sobre um riacho e dentro do riacho o barquinho da pesca, uma
casa coberta de sapé, um varal de estender roupas ao sol, um cachorro perto do
poço de sarilho).
Nesta foto que está na minha e
na sua cabeça: o que é natureza e o que é cultura?
A resposta é muito simples: Natureza é tudo aquilo que Deus fez (a
montanha, o riacho, o cachorro, a árvore, o sapé, o sol), cultura é tudo
aquilo que o homem e a mulher fizeram (é a casa, é o banquinho, o
barquinho, a ponte sobre o riacho, o varal, a roupa). Portanto, cultura é
tudo aquilo que a gente faz para poder ter melhor qualidade de vida.
Mas há dois tipos de produtos culturais. A culinária é cultural
e nós preparamos os alimentos para comê-los, diferentemente dos outros animais que
comem sem nenhum preparo tempero, cozimento...
Realmente não existe só a cultura do comer, do vestir, do morar, ser
transportado... Existe outra cultura também importante: “Tem a cultura daquilo que a gente produz e
tem a cultura daquilo que dá sentido
para a vida da gente”. Para falar duas palavras acadêmicas: Tem a cultura
material (o banco, a casa, o
barco, o varal, a ponte...) e tem a cultura simbólica (ligado ao valor do significado).
Olhamos as nossas mãos e sabemos que ela é uma ótima ferramenta para
pegar, apalpar. E sabemos que todos os animais a possuem e só por meio de
adestramento que algum de nosso animalzinho de estimação pode expressar símbolos
utilizando “as mãos”. Mas para o ser humano o gesto é um símbolo cultural.
Se eu fizer positivo, é fácil a apreensão do significado deste símbolo
positivamente, mas se eu fizer qualquer gesto obsceno o seu significado será
oposto ao anterior. Portanto, a cultura simbólica é muito forte em nosso
dia-a-dia.
Outro exemplo: “se você estiver andando por uma estrada e encontrar
dois gravetos no chão, não vai dizer nada para você. Se ao voltar por este
mesmo caminho encontrar aqueles gravetos enfiados no chão e amarrados um na
horizontal e outro na vertical, você ali pára para rezar”. Observe, são os
mesmos gravetos, mas foram transformados num símbolo cultural-religioso.
O símbolo mais significativo de nossa cultura ocidental é a cruz. A
cruz, como ainda é um problema para nós cristãos, (sofrimento), portanto, não se
torna um símbolo cristão por excelência. É o nosso desafio para o terceiro
milênio: encontrar um símbolo que por excelência expresse nossa fé na
ressurreição. Nós temos ainda um
símbolo da morte e não da vida. Dificilmente se encontra em igrejas e
santuários algo que simbolize Jesus Ressuscitado.
Todos nós temos cultura e somos seres culturais. Todos nós fazemos
cultura material e simbólica. Mas muita gente pensa que não tem cultura.
A pergunta que fazemos é a seguinte: Por que vivemos numa sociedade
desigual como a do Brasil?
A
elite brasileira é composta de aproximadamente 40 milhões de pessoas - os
incluídos - os que possuem qualidade de vida total. Como a modernidade está ao
seu serviço, para estes se dirigem as propagandas de marketing do mercado
neoliberal. Nós sabemos que o Brasil não possui apenas 40 milhões, somos aproximadamente
180 milhões de pessoas. Somos aproximadamente 120 milhões de brasileiros (as) mais
ou menos 20 milhões de crianças que ainda estão aprendendo a andar. Portanto, há mais ou menos 120 milhões de
pessoas fora do mercado de consumo de bens supérfluos (a que se dirige o
marketing para a elite). Nós consumimos arroz e feijão, mas não dá para
consumir livros, escolher marcas de xampu, escova de dente, creme dental,
sabonete, pagar um transporte melhor, comprar um carro, Nem pensar! Isso só é para os 40 milhões de incluídos
(que tudo têm e podem).
Ora, todos nós temos cultura, mas nem sempre sabemos de nosso
“valor cultural”, porque numa sociedade desigual, a cultura que predomina é
a de quem manda na sociedade (a elite - donos do poder sócio-político-econômico
e ideológico).
No passado do Brasil havia escravo: “quando um escravo fugia quem ia
atrás não era o dono dos escravos (os senhores) e sim outro escravo”. Exemplo
um pouco recente: os soldados, que atiraram nos sem-terra em Eldorado dos
Carajás, são eles também sem terra e filhos de sem terra.
O que acontece é o seguinte: numa sociedade desigual, a cabeça do
oprimido “tende” a pensar pela cabeça do opressor.
“A cabeça dos pequenos tende, ‘nem sempre é assim’ a ser hotel do
grande”. Vamos nos perguntar: será que a minha cabeça hospeda mentalidade do
grande ou estou pensando com a minha própria cabeça?
Um exemplo da vida:
Um médico sedento para ajudar as mulheres da favela a cuidarem melhor
de seus filhos e a ajudá-las no planejamento familiar com os métodos naturais
de contracepção.
O Problema: nós que passamos por faculdades e ou
universidades temos muita dificuldade de falar a linguagem popular de nosso
povo simples. Às vezes sintonizamos em FM e o povo em AM e aí há uma falha na
comunicação. Para que haja comunicação é
preciso estar na mesma sintonia. Quando se descobre o ponto de curto circuito
da comunicação corrige-se ali.
Dr. Raul começou a explicar para as mulheres da favela sobre a
importância do leite materno. Começou dizendo: “D. Maria, o aleitamento materno
é indispensável para a criança, pois ajuda na formação esquelética, cálcica, prevenção
de diversas doenças infecto bacteriológicas, etc”.
Estando lá um intelectual orgânico (Staccone, Giuseppe, 1991. p. 83-89.): aquele que sabe descer ao nível do povo,
perguntou a D. Maria: “A Sra., entendeu
tudo o que o Dr. Raul explicou para a senhora.?” Ela disse: “Não”. Perguntou: “Por que a Sra., não
entendeu?” “É porque o Dr. Raul é
estudado e eu não!” - respondeu D.
Maria. Aí o intelectual orgânico perguntou
ao Dr. Raul: “Dr. Raul, o Sr. sabe cozinhar? “Ao que respondeu que não, perguntou
se D. Maria sabia cozinhar. Ao que respondeu: “Sim”. Então pediu a ela que
explicasse como é que faz frango a cabidela. D. Maria nos explicou desde
o matar o frango até chegar ao ponto de servir. Foi uma senhora aula de
culinária.
Disse à D. Maria: “Se um dia a senhora e o doutor Raul se perderem
numa floresta e lá só tiver uma galinha, a senhora sobreviverá e o Dr. Raul com
todos os seus diplomas não” D. Maria deu-lhe um sorriso de orelha a orelha, e
descobriu, naquele dia, que não existe gente mais culta do que outra.
O que existem são culturas paralelas, culturas diferentes -
todos os humanos têm cultura.
Mas acontece que, numa sociedade em que poucos vão à escola (cf. Fraternidade e Educação, 1998), estes poucos tendem a dominar os que
não tiveram chance. Usam todos os meios possíveis (rádio e TV) para enfiar na
cabeça de quem não foi à escola ou que foi por pouco tempo, que só têm valor
cultural aqueles que exibem um diploma - quem não tem diploma - não tem
cultura. Essa é uma grande mentira cultural que temos que arrancar das
nossas mentes.
Se você perguntar para mim como se organiza um encontro, uma aula, uma
palestra, eu penso que tenho cultura – experiência para dizer. Mas se me perguntar como é que faz certas
coisas daquilo que todos os dias vocês fazem, eu garanto para vocês que não vai
dar em nada, pois existem coisas de seu trabalho que só você sabe fazer e mais
ninguém. (carpinteiro, pedreiro, funileiro, mecânica, eletricista, pintor...), nada
disso eu saberia fazer: pois eu não tenho cultura para isso.
Mas, numa sociedade desigual, colocaram na cabeça da gente - que quem
tem cultura cerebral é o verdadeiro dono da cultura. E quem tem cultura
manual (labor manual) não tem cultura.
Se você perguntar para um intelectual biólogo ocidental o que é um
elefante: ele começa a descrevê-lo na sua composição biológica. O povo quando
diz de alguma coisa é porque já fez a experiência real daquilo que confirma.
3.2 - A cultura de Jesus no contexto de
seu tempo
Jesus foi um homem que tinha consciência da cultura de seu tempo (Saulnier, Cristiane &
Rolland, Bernard. A Palestina no Tempo de Jesus, Ed. Paulinas, 1983, Col.
cadernos Bíblicos). E
a cultura que estava na cabeça dele não era a mesma que estava na cabeça dos
que mandavam na Palestina de seu tempo.
Na Palestina: seguiam-se alguns costumes:
· Na hora de comer deviam lavar as mãos (três vezes);
· Jesus já sentava com seus discípulos e comiam sem lavar as mãos. Sabia que na região tinha pouca água (como no
nordeste como um todo) e era preciso economizar água para coisas mais vitais.
· Jesus diz bravamente a eles: “vocês
deveriam lavar os vossos corações e não as vossas mãos, pois não é o que entra
no homem que suja, e sim o que sai de dentro do homem”.
A cultura de Jesus era a favor da vida e a
cultura dos fariseus era a cultura da lei - da obediência - do poder que oprime.
No trabalho que temos cada qual exerce uma função, e muita gente que
fez faculdade ou universidade, nunca conseguirá fazer o que uma pessoa do meio
popular sabe.
Mas
na cabeça da gente tem muita coisa que é da cabeça do grande. Para que isso
mude, é preciso ter uma consciência crítica em face da pluralidade cultural.
E aqui vale o ensinamento de Jesus: “fez-se carne e habitou entre
nós”. Habitar no meio das diversas culturas e acolher o diferente e buscar, junto,
o resgate das dívidas sociais no campo das culturas, é uma preocupação
constante da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.
3.3 -
Definição:
Cultura: Conjunto
de modos de vida criados e transmitidos de uma geração para outra, entre os
membros de determinada sociedade. Abrange conhecimentos, crenças, artes, moral,
leis, costumes e quaisquer outras capacidades adquiridas socialmente pelos
homens (Coltrin, 1993, p. 15.)
A cultura pode ser considerada, portanto, como amplo conjunto de
conceitos, de símbolos, de valores e de atitudes que modelam uma sociedade. Ou
seja, a cultura engloba o que pensamos, fazemos e temos enquanto membros de um
grupo social. O termo cultura é
aplicável a qualquer civilização (antiga, moderna, contemporânea). Todas as
sociedades humanas, da pré-história aos dias atuais, possuem cultura.
A cultura é a resposta oferecida pelos grupos humanos ao desafio da
sua existência. Em termos de conhecimento (logos), paixão (phatos) e
comportamento (ethos). Isto é, em termos de razão, sentimento e ação.
A cultura é um conceito relacional entre uma cultura e outra. Mas nem
sempre se dá com tranqüilidade. Vale afirmar que cada cultura deve ser
entendida em seus próprios termos, em sua especificidade, mas sua existência é
sempre relacional e seus conteúdos resultados de uma dinâmica interativa.
‘A cultura mapeia o mundo presente’
Com a palavra ‘cultura’ indica-se a maneira particular como em
determinado povo cultivam os homens sua relação com a natureza, suas relações
entre si próprios e com Deus, de modo que possam chegar a um nível verdadeiro e plenamente
humano. É o estilo de vida comum
que caracteriza os diversos povos; por isso é que se fala de “pluralidade de
culturas” (Vaticano II, 1968, GS nº. 53).
Assim entendida, a cultura abrange a totalidade da vida de um povo:
o conjunto de valores que o anima e dos desvalores que o enfraquece e que, ao
serem partilhados em comum por seus membros, os reúnem na base de uma mesma
consciência coletiva (Paulo VI,
Evangelli Nuntiandi, nº. 18).
A cultura abrange as formas através das quais estes valores e
desvalores se exprimem e configuram, isto é, os costumes, a língua, as
instituições e estruturas de convivência social, quando não são impedidas ou
reprimidas pela invenção de outras culturas dominantes (CELAN. Puebla , nº. 387)
3.4 -
Características da cultura
·
A
cultura é duradoura embora os indivíduos que compõem um determinado grupo,
desapareçam.
·
A
cultura se modifica conforme mudam as
normas de consenso.
·
É
adquirida pela aprendizagem e não herdada pelos instintos.
·
É transmitida de geração a geração, através da
linguagem.
·
É
criação exclusiva dos seres humanos, sendo, então, um traço distintivo da
humanidade.
·
Inclui
todas as criações materiais e não materiais dos homens.
·
Apresenta
estruturas duradouras, mas também sofre evolução através da história.
·
É
um instrumento indispensável à adaptação do indivíduo no meio social, tornando
possível a expressão das potencialidades humanas.
3.5 - A
importância da Linguagem
De fato, a linguagem é um dos traços
mais característicos da humanidade. Fala-nos Benjamim Whorf que: a linguagem
constitui o mais belo espetáculo já encenado pelo homem. Mas, no que consiste
a linguagem? É a capacidade que permite aos homens comunicarem-se uns com os
outros por meio de um código. (convencional).
Diz-nos E. Sapir que: a Linguagem é um método puramente humano e não
instintivo de se comunicar idéias, emoções e desejos por meio de símbolos
voluntariamente produzidos.
A língua é o solo comum da cultura de um povo (cf. Heidegger, Martin, 1991). Os homens são seres culturais que modificam o estado de natureza.
Mediante a cultura, o homem criou para si próprio um “mundo novo”,
diferente do cenário bruto originalmente encontrado. Dentro da biosfera,
o homem foi criando a antroposfera. Essa antroposfera, criada pelas
diferentes culturas, é a morada do homem no mundo: é o cosmo humano.
Constitui um espaço desenvolvido e compartilhado pelos diferentes grupos
humanos.
3.6 - A
síntese humana
O comportamento do homem é fundamentalmente diferente ao dos
animais. É certo que o ser humano faz parte da natureza, pois tem um corpo
sujeito às leis físicas e biológicas. Mas graças ao desenvolvimento de seu
psiquismo pode observar a natureza, criar uma linguagem e, assim, analisar e
julgar o mundo em que vive.
Com seu alto grau de consciência o homem faz uma síntese que integra
características hereditárias adquiridas, aspectos individuais e sociais,
elementos do estado de natureza e de cultura.
O homem é um ser contraditório, ambíguo, instável e dinâmico. Um
produto da natureza e da cultura e, ao mesmo tempo, um transformador da
natureza e um produtor cultural. Enfim, criatura e criador do mundo em que
vive.
Essas características tornam o homem admiravelmente singular. Um ser
capaz de dominar a natureza mesmo fazendo parte dela. Capaz de criar coisas
extraordinárias como, também, de destruir de modo devastador. Capaz de acumular
um saber imenso e, no entanto, permanecer angustiado por dúvidas profundas que
o fazem sempre propor novas perguntas e novos problemas a si próprio.
3.7
- A cultura de Massa
“A comunicação se torna a forma pela qual se organiza o mundo da vida
com toda a sua riqueza” Antônio Negri.
As tecnologias de comunicação sempre alteraram a experiência
humana. A televisão traz para dentro de
nosso refúgio doméstico as imagens longínquas do planeta. Quero aqui chamar
atenção para os Meios de Comunicação de Massa (entendida como TV, rádios,
jornais e revistas...). O que acontece com as tradições culturais populares
quando a televisão apresenta o mesmo “produto televisionado” para qualquer
região do País?
A hegemonia da televisão é constatada quando é utilizada para a
consolidação de consensos a cerca da realidade sócio-política e econômica. A
influência da televisão na vida das pessoas é tão abrangente que se torna
difícil medir a real dimensão. A idéia
mais difundida é a de que os meios de comunicação, e especialmente a televisão,
inculcam idéias para forjar e controlar a vontade e o gosto dos
telespectadores.
Na questão política, não há dúvida que a mídia pode eleger ou derrubar
candidatos. Basta retomar a candidatura Fernando Collor de Melo em 1989 e em 1994
Fernando Henrique Cardoso, e como se dá
a influência das pesquisas nas atuais eleições de 2006.
Nosso ponto de partida não é refletir o que os meios de comunicação
fazem com as pessoas, mas, ao contrário, o que as pessoas fazem com os meios de
comunicação - Será que estamos criando uma “cultura de resistência”?
Não adianta recusar a cultura de massa, em vista da alienação que ela
possa causar - vale muito mais assumir nossa cultura local e fazer dela
expressão de nossa vida.
Ser massa, no nosso contexto, tem muito a ver com o desenraizamento de
tradições populares religiosas do interior. Falava-nos, Herbet de Souza, que: a
democracia é que desenvolve o mundo e ela se constrói com e através da
comunicação.
Precisamos
“zelar para que os meios de comunicação social não manipulem nem sejam
manipuladores ao transmitirem, sob pretexto de pluralismo, o que destrói o povo
latino-americano, mas fortaleçam a unidade da família e sua influência na
formação da consciência cristã” (CELAM. S. Domingo, nº. 238).
Uma
luta que temos que travar é a democratização dos meios de comunicação
social. Também devemos ter o interesse na área da comunicação alternativa
(Jornais e boletins comunitários), o uso de espaço e a consolidação dos
projetos de rádios comunitárias que hoje são tão combatidas pelas legislações e
pelas rivalidades com as rádios comerciais; nesse campo ainda precisamos nos
organizar para melhorar nossa capacitação no serviço comunitário no exercício
do ofício na comunicação alternativa.
3.8 -
Pluralidade de culturas
Falta-nos perguntar: quais são as culturas existentes em nossa
sociedade (comunidades eclesiais e instituições educacionais)? Como integrá-las
em nossa vida social e comunitária?
3.8.1 - A cultura negra: presente pela dimensão da corporeidade: deve-se ressaltar a importância
do corpo e de sua força de expressão. Existem alguns espaços em que poderiam
ser mais bem aproveitados na comunidade e nas diversas instituições de
educação. Uma tarefa irrenunciável é a superação do preconceito. A inclusão dos
estudos sobre etnia e negritude nos currículos das escolas estaduais, e a
separação de cotas nas universidades, no projeto educacional brasileiro, para
as minorias étnicas ter o acesso ao ensino superior em escolas particulares e
em escolas públicas, torna-se, hoje, uma
bandeira de conquistas e lutas das organizações dos negros e outras minorias.
Mas, por que um projeto dessa magnitude ainda precisa ser forçado, por um
decreto lei? Sabemos que a sociedade brasileira crescerá à medida que souber incluir
as minorias étnicas superando as desigualdades sociais, possibilitando
igualdade de oportunidades a todos os homens e mulheres que foram injustiçados
historicamente. Talvez o critério de raça seja pouco em relação à histórica
desigualdade social em que muitos são colocados à margem da sociedade e
acredito que é fundamental deslocar o elemento racial para o elemento social, a
pobreza que atinge a todas as raças e principalmente as minorias étnicas.
3.8.2 - A cultura indígena: “Foi vitimada, genocídio dos índios e de sua cultura”. Resgatar a
cultura indígena é buscar maior integração humana com a natureza. Nossos irmãos índios nos ensinam a viver em
harmonia com a natureza. Em muitas comunidades e em instituições educacionais
tem-se pesquisado sobre a sabedoria milenar dos povos indígenas e há uma busca
na compreensão deste seu universo mostrando a harmônica relação dos mesmos com
a o cosmo despertando em nós o desejo do cuidado com a nossa casa mãe.
A terra que pede: - socorro! Seus gritos ecoam em nossos ouvidos e nos
faz militantes da causa do “cuidado”
com a nossa casa comum. Dentre as contribuições mais recentes está as
descoberta do valor vital e medicinal dos alimentos e dos remédios naturais,
uma proposta assumida por muitas pessoas que se converteram à vida mais
natural, tornando-se parceiros de luta das causas indígenas.
3.8.3 - A cultura da mulher: “As mulheres são a metade
do mundo e mãe da outra metade”. Na descoberta da cultura o século XXI se apresenta como aquele que
busca uma integração do feminino e isto está presente em muitas instituições.
Há a emergência do feminino em todos os espaços que no passado era apenas
visível o masculino, nesta mudança está em jogo a “dimensão feminina” da cultura daquelas que apontam para alguns valores
que hoje são irrenunciáveis, aqui enumerados: o cuidado da vida, a
sensibilidade, o acolhimento, a ternura, a graça e tantos outros tantos. Que
são valores femininos que dizem respeito a toda humanidade, a homens e
mulheres.
3.8.4 - A cultura dos
Migrantes: O fenômeno das Migrações é universal. Migrar - trocar de
país, de estado, de região ou até de domicílio – é fenômeno tão antigo como a
história da humanidade. As condições em que se dão variam muito e de região
para região.
Quando esta
experiência de migrar é realizada de livre e espontânea vontade, pode gestar
uma nova história na vida e convivência daquela sociedade fomentando
intercâmbio e inculturação de valores integradores de novas perspectivas
culturais. Mas, o contrário também se verifica, quando as pessoas, famílias e
grupos migram sob pressão: E aqui faço as seguintes enumerações:
Ø Por condições
sociais adversas no lugar de origem.
Ø Devido a políticas
econômicas adotadas que desfavorecem a gestação de uma vida condigna.
Ø Quando iludidas e
atraídas por propagandas enganosas e falsas promessas
Ø Descaso com a
agricultura – favorecendo os latifúndios e não os pequenos agricultores.
Ø Pressão política e
militarismo.
Ø Fenômenos da
natureza (secas e enchentes).
Na história do Brasil, existe uma miscigenação e um ethos
pluricultural, isto nos enriquece. As
diferenças nos aproximam.
A migração
não é fenômeno natural e espontâneo. É, sim, manifestação perversa de um
conjunto de estruturas injustas de ordem econômica, política, social e
ideológica. É a classe dominante que detêm este poderio e mantém, na miséria, o
sofrimento do migrante que “caminha contra o vento sem lenço e sem
documento”[9] - na
linguagem poética de uma cantor brasileiro.
O sistema
produz migrante: trabalhadores que, circulando de um lado para o outro,
funcionam como exército de reserva, pronto para mendigar uma sobrevivência cada
vez mais dura e sofrida. Há uma concentração de renda cada vez mais acumulativa
nas mãos de poucos e uma queda brutal do nível de vida da população. Seguindo a
lógica do capitalismo, o capital torna-se o centro da sociedade. A saúde do
sistema econômico está subordinada ao empobrecimento doentio dos trabalhadores,
que são sacrificados para que seus opressores sobrevivam tranqüilamente.
A maioria das migrações forçadas é dramática,
deixam marcas de sofrimentos, sobretudo no aspecto da desagregação
psicossocial. O ser humano através do exercício da liberdade quer ter dignidade de vida – exercendo o direito
de ir e vir e permanecer – sair em busca de seu sonho.
3.8.5 - A cultura dos camponeses: É preciso trabalhar a questão cultural dos camponeses: sua visão de
mundo, sua religião. É um caminho a percorrer, existem muitas interrogações e
algumas respostas só serão possíveis se analisarmos o aspecto social da
questão:
A tendência à
concentração fundiária é, em nosso país, fenômeno que mergulha as raízes nos
primórdios de nossa história de colonização. A política agrícola e agrária,
especialmente a política de crédito e a falta de um seguro agrícola abrangente
favorece as empresas e latifúndios, asfixiando o pequeno proprietário que, sem
alternativa, se desfaz da sua própria terra. A pequena propriedade sofre ainda
a pressão do crescimento populacional. Amplia-se a família, mas o tamanho da
propriedade permanece o mesmo, sendo impossível subdividi-la por muitas
gerações. Isso provoca a migração dos “filhos sem herança”. Os sítios vão sendo
engolidos pelas grandes propriedades, que tem grandes incentivos fiscais por
parte do governo. Mas, muitos camponeses com força e coragem, resistem e lutam
(individual ou coletivamente) na permanência em sua terra. Mas, nalguns casos a
“única solução que encontram para tirar a corda do pescoço” é vender a terra
para os latifundiários. Desta maneira crescem, de igual forma a quantidade de
latifúndios e de trabalhadores sem terra.
3.8.6 - A cultura dos operários: É uma cultura ligada ao desenvolvimento da grande indústria e
simultaneamente ao avanço das lutas sindicais e populares na cidade. “O
operário é uma invenção dos tempos modernos tanto quanto o maquinário” (Marx, O
capital,1856).
3.8.7 - A cultura industrial urbana: Neste âmbito, existe a cultura
desencanto que procura esvaziar a força da religião para deixar valer apenas o
ídolo do mercado, lucro, consumo, dinheiro. E aqui cabe a seguinte
contextualização:
O contingente de migrantes, que ocorre às
grandes cidades, se concentra nas áreas periféricas, estendendo o cordão de
miséria para além do perímetro urbano e ocasionando um “inchamento” tão caótico
quanto desumano. Os problemas administrativos, sociais, familiares e psíquicos
que esse fenômeno da “periferização” traz são incalculáveis, pois tem provocado
não apenas o crescimento das grandes metrópoles e das capitais dos Estados, mas
o conseqüente “inchamento” vertiginoso das respectivas cidades periféricas ou “cidades
dormitórios”, com taxa de crescimentos superiores às da própria capital. Quem
mais sofre são os filhos. É crescente o número de delinqüência, menores
abandonados, prostituição precoce, desemprego em massa, desumanização da
moradia (favela, cortiço, pró-morar), o trabalho do menor. As condições de vida vão se
deteriorando.
3.8.8 - A cultura dos marginalizados: É toda essa massa de gente solta, que
sobrevive às margens do sistema econômico, sem um trabalho definido ou
reconhecido: desempregados, subempregados, marginais de toda sorte. Nesta
multidão heterogênea existem mil subculturas. Mas existe uma “cultura geral”,
uma espécie de “cultura de sobrevivência”, feita de um sincretismo muito
complexo, das espertezas na arte de sobreviver, do messianismo religioso e
político.
3.8.9 - A cultura da conscientização: “o sono da razão gera monstros” (Gaya).
A saída está na busca de uma razão sensata, que não signifique a supressão da
razão crítica. Trata-se de criar uma nova cultura crítico-popular.
Considerações finais
Conhecer o fenômeno da modernidade é essencial para que haja respeito
à cultura popular como alternativa à integração dos seres humanos nos ambientes
e contextos em que vivem. Reconhecer a pluralidade cultural e religiosa em nosso
meio, já é um avanço para que o diálogo se torne uma realidade possível de ser
engendrada em nossos ambientes. Aqui emerge a necessidade de redescobrir em
nossos discursos e práticas a categoria da Inculturação. Pois, A
Inculturação será de agora em diante a chave hermenêutica para medir a nova
temperatura educacional nas instituições de ensino e religiosas. A
inculturação determinará o modo de a instituição educacional e religiosa ser
e o como da instituição educacional e religiosa agir no serviço à vida e
à esperança numa sociedade de conflitos, que vive sob o binômio: Cultura
de Morte e Cultura de Vida. Nossa atitude aqui será de defesa da vida
em vista da solidariedade humanitária.
O
resgate da dignidade do ser humano é uma tarefa irrenunciável de toda a
sociedade. Buscar caminhos alternativos para a exclusão social e tais
circunstâncias é fundamental o trabalho na educação em vista da consolidação de
atividades educacionais libertadoras e transformadoras das consciências. Sabemos
que em tal circunstância em que vivemos não há mais espaço para a passividade,
o caminho é coletivo, não podemos desejar a salvação individual, pois o planeta
todo pede socorro através dos “sinais dos tempos”. É necessário que haja um
engajamento sócio-histórico de cada cidadão cósmico, pois “tudo que fizermos à
terra estamos fazendo aos filhos da terra”.
É fundamental que a América procure incentivar
uma cultura da vida em face da cultura de morte. A gestação de um novo processo
religioso na perspectiva da integração das diferentes culturas nos ajudará
formar pessoas e comunidades maduras para o convívio com o diferente em busca
de respostas à nova situação em que vivemos provocadas pelas mudanças sociais e
culturais da modernidade. Neste processo devemos conhecer bem a realidade que
nos envolve, com suas sombras e luzes: o fenômeno da urbanização, do
empobrecimento e da marginalização em que vive a maioria do nosso povo. A
sociedade moderna está inserida em uma mentalidade fortemente materialista e
aqui os mecanismos de morte estão em alta pelo consumismo, e exclusão da
maioria dos bens de produção. Para nós, tudo isto é novo e traz consigo questionamentos
acerca dos valores: solidariedade,
justiça, crenças, religião e a superação de ideologias. Muitos, após terem
"perdido o sentido vivo da fé, inclusive, já não se reconhecem como
membros da Igreja e levam uma existência distanciada de Cristo e de seu
Evangelho” (João
Paulo II. Redemptoris Missio. nº. 33). Encontram em comunidades pequenas e acolhedoras respostas para a sua
humanidade aviltada de diversas maneiras por uma sociedade desumana e
descristianizada. Quando encontramos Jesus Cristo em nossa vida redescobriremos
o sentido profundo de sermos filhos (as) de Deus, dignidade que ninguém
nos pode roubar porque é graça, não permitindo que nenhuma realidade temporal,
nem os Estados, nem a economia, nem a técnica se convertam para os homens na
realidade última a que devamos nos submeter.
Nas
palavras de Paulo VI, evangelizar é anunciar "o nome, a doutrina, a vida,
as promessas, o Reino, o mistério de Jesus de Nazaré, Filho de Deus” (Evangelli Nuntiandi, nº. 22) como resposta a toda interrogação de
nossa vida humana, é trabalhar na formação de uma nova consciência cristã
integradora das culturas diferentes e isso nos ajudará a descobrir o novo do
Reino de Deus em nosso cotidiano.
Bibliografia Consultada
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Dussel (1962-1976), Ed. Vozes Petrópolis RJ, , 2ª. Ed. 1987.
José Igídio dos Santos
Filósofo e Teólogo
E-mail: j.igidio@gmail.com
* Licenciado em Filosofia e Bacharel em Teologia, Gestão Publica e Especialista em Filosofia e Psicopedagogia. Docente
na Rede Estadual de São Paulo e na Faculdade de Educação, Ciências e Artes Dom
Bosco (FAECA), Monte Aprazível-SP.
[1] Encontro com autoridades Mundiais na Eco-92, no Rio de
Janeiro. E a questão da biodiversidade levantada e até hoje em tramite no
Congresso Nacional, sem uma resposta satisfatória.
[2]"O Horror Econômico", de Viviane Forrester, é um recente livro lançado
na França, com onze edições em seis meses. Aborda o tema economia e emprego.
Está sendo lançado também em outros países da Europa. No Brasil foi publicado
em 1998 pela braziliense. O livro de Viviane
Forrester – vem confirmar o enfoque mundial na questão do emprego e
nós brasileiros estamos implicados nesta situação, que é mundial. Vivemos no
mesmo sistema de uma única lógica. Atravessamos um momento grave: é a primeira
vez na história que o conjunto de homens não é importante para fazer funcionar
o planeta e para produzir lucro. Antes era diferente. Atravessamos uma crise de
emprego. Não digo crise de trabalho, porque é um valor fundamental que existirá
sempre. Enfrentamos mais do que uma crise do emprego e vivemos uma mutação de
sociedade e de civilização
[3] Amplia-nos a concepção de solidão e sua vivência na
prática cotidiana
[4] Trabalha a dimensão do prazer de uma maneira positiva
para a superação do prazer egolátrico, ensimesmado.
[5] Ajuda-nos a recuperar a dimensão da alteridade na... ,
da... e para a vida.
[6] Esta possibilita-nos compreender o outro lado da
moeda. Descortinando o dever e emancipando o prazer, numa perspectiva
integradora e não de supremacia de uma atitude sobre outra.
[7] As eleições são um jogo de melhor apresentação
estética dos candidatos e nem sempre de seus projetos políticos para o pais.
[8] A modernidade entrou em colapso com a queda das
utopias e dos muros, que evidenciou a impossibilidade de solucionar a
estratificação social através da
evolução científica que, de acordo com os iluministas seria o fator gerador do
paraíso terrestre. Assumindo uma
vertente conceitual aberta e construtiva do conceito de pós-modernidade que a
nosso ver é um conceito plural e multi-facetado com uma percepção paradigmática de vivermos
contemporaneamente na sociedade da informação. Hoje, o acesso ao conhecimento é
possível com o uso da informática e da rede mundial e vemos ainda, no início do século XXI o
avanço bio-tecnológico, biofísico... No âmbito macro e no âmbito micro vivemos
situações de desolação e expectativa geopolítica e econômica, o que torna
instável a manutenção da qualidade de vida ao ser humano. Este, que possui
dentro de si um enorme desejo de ser valorizado, sofre com os contrastes entre a falta de acesso à
técnica no processo produtivo e com o
processo de automação, este último tem gerado desemprego em massa e
aviltado a dignidade subjetiva do ser humano. Algumas questões são ainda
necessárias: O que é o ser humano? Quais são suas reais necessidades? O
contexto atual responde às suas expectativas?Como conciliar desejo e
realização? Como superar o consumismo tão acentuado em nossa sociedade capitalista?Qual a equalização do uso dos
recursos naturais? Que modelo de sociedade responde ao nosso contexto atual com
contrastes muito visíveis (consumidores
X consumo; trabalhadores X produção) Estamos realmente numa condição pós-moderna ou vivemos um
mosaico de concepções que mistura aspectos da cultura moderna e da pré-moderna?
[9] Veloso, Caetano. K7 - Alegria, Alegria, 1960.
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